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Este consultório da Oficina de Psicologia tem por objectivo apoiá-lo(a) nas suas questões sobre saúde mental, da forma mais directa possível. Coloque-nos as suas dúvidas e questões sobre aquilo que se passa consigo.
Autora: Irina António
Psicóloga Clínica
As crianças sentem medo mais frequentemente do que aquilo que nós, adultos, possamos imaginar. Por cada caso de medo expresso, há muitos casos de medo experienciado em silêncio, de medo oculto e escondido por detrás dos comportamentos agressivos, da timidez excessiva ou das queixas somáticas. Este medo “vem à superfície” nos momentos em que se abre um espaço onde a criança possa falar sobre o que sente sem receio de ser julgada, de incomodar ou assustar os outros com a expressão do seu sentimento.
A maior parte dos medos aparece num período compreendido entre os 4 e os 6 anos, tendo um pico de sensibilidade aos 6. O facto de os medos serem compreendidos culturalmente como uma “emoção negativa” faz com que os pais se esforcem para explicar aos pequeninos como ultrapassá-los, mas poucas vezes darem atenção à aceitação das suas experiências emocionais. Esta estratégia também pode derivar da baixa tolerância às emoções fortes dos próprios pais, o que contribui para reacções como: ignorar, negar ou desvalorizar, tentar acalmar a todo o custo, rotular o medo como uma doença e insistir na medicação.
As crianças aprendem através da interiorização dos comportamentos dos adultos, e no caso do medo, há um risco da criança interiorizar o medo de ter medo. Assim, por exemplo, o inicial medo do cão pode ser transformado no medo de estar atormentado sempre que se cruze com um cão, bem como a disposição ansiosa, agitada e de evitação perante novas experiências.
As crianças necessitam que os seus medos sejam reconhecidos, aceites e respeitados. Olhar tranquilamente, escutar e estar com o medo delas são manifestações de segurança no momento de partilha das suas vivências inquietantes e perturbadoras. Esta atitude do adulto também transmite a mensagem de que existem várias escolhas no modo de reagir.
A aceitação significa: “sim, os bandidos podem ser mesmo perigosos”, “é verdade, às vezes, é muito difícil falar quando tanta gente está a olhar para ti”, “tu inventaste um monstro terrível”. Claro que isto tudo só é possível, se o próprio adulto não estiver afogado na sua própria ansiedade e no medo insuportável.
O outro passo importante a tomar depende do tipo de medo da criança. Se ela se sente receosa por não conseguir executar uma tarefa ou errar numa resposta, a mensagem pode ser a seguinte: “vamos dar a mão ao teu medo e começar a fazer ou a falar…”. Em colaboração com a criança, pode ser inventada uma história, cuja personagem principal tem muito medo, mas cujo medo não a impede de fazer seja o que for e permite obter diversas experiências novas. É necessário explorar e apoiar os desejos da criança: “queres subir a escada, eu estou ao teu lado”, “é verdade está muito alto, mas estás a apoiar bem os teus pés e eu estou a ver”.
Parafraseando as palavras da terapeuta infantil V. Oaklander, deixo-vos uma mensagem: os adultos que se atrevem a entrar em contacto com as experiências da criança vão ganhar uma oportunidade de se compreender melhor a si próprios.
João Sem Medo é uma iniciativa da Oficina de Psicologia que visa ensinar às crianças, na prática, a lidar eficazmente com os seus medos (http://www.oficinadepsicologia.com/oficininhas.htm).