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Este consultório da Oficina de Psicologia tem por objectivo apoiá-lo(a) nas suas questões sobre saúde mental, da forma mais directa possível. Coloque-nos as suas dúvidas e questões sobre aquilo que se passa consigo.
Autora: Joana Fojo Ferreira
Psicóloga Clínica
Recentemente li o livro A traição do Eu: O medo da autonomia no homem e na mulher de Arno Gruen (edição da Assírio & Alvim), e apercebi-me como de facto tendemos a gerir as nossas vidas de acordo com uma ideia de autonomia incongruente com o que ela realmente implica.
Segundo o autor, “a autonomia é o estado de integração em que uma pessoa se encontra em plena concordância com os seus sentimentos e as suas necessidades. (…) Da autonomia faz parte a capacidade de ter um Eu alicerçado no acesso a sentimentos e necessidades genuínos.” (págs. 17 e 18).
Paradoxalmente, geralmente associamos a pessoa autónoma à pessoa independente, controlada, bem adaptada socialmente, por muito que esta pessoa possa não reconhecer qualquer sentimento de tristeza, zanga, medo, ou qualquer necessidade de proximidade, de conforto.
Ao colocarmos este peso na ideia de autonomia, colocamo-nos necessariamente em conflito entre um Eu ideal (supostamente autónomo porque independente e controlado), favorecido pela sociedade ocidental actual, e o Eu real (genuinamente autónomo, mas não reconhecido socialmente como tal), que por vezes tem dores, que tem fragilidades, que precisa de proximidade e de conforto. Estranhamente, este é o Eu socialmente rotulado como fraco e dependente.
Assim, quando puxamos o suposto lado da autonomia (portanto o independente e controlado), reprimimos a possibilidade de satisfação no contacto com a nossa realidade interna e a possibilidade de conforto na interdependência (no equilíbrio entre a proximidade e o isolamento). Criamos a fantasia que ou somos “autónomos” e fortes ou somos dependentes e fracos, sem percebermos que proximidade e autonomia não são incompatíveis, eu não preciso de me isolar para ser autónomo e posso retirar conforto na proximidade sem me tornar dependente.
É muito importante percebermos que a nossa saúde mental não passa por nos adaptarmos às expectativas dos outros negligenciando-nos a nós próprios; a nossa saúde mental passa por encontrarmos, mantendo-nos próximos aos outros, um espaço para reconhecermos e cuidarmos das nossas emoções e necessidades.