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Este consultório da Oficina de Psicologia tem por objectivo apoiá-lo(a) nas suas questões sobre saúde mental, da forma mais directa possível. Coloque-nos as suas dúvidas e questões sobre aquilo que se passa consigo.
Autora: Inês Mota
Psicóloga Clínica
Com frequência, em consultório, as pessoas consciencializam-se de que não é tarefa simples conhecerem o que sentem e saberem “falar” com elas próprias ou com os outros acerca disso, ou seja, a expressarem o que sentem.
A maneira própria como cada um de nós usa a “emoção” ou a “razão” pode estar fundada na forma como fomos aprendendo a usá-las no contexto da nossa família, e como foi perpetuada nas relações com o nosso grupo de amigos, na escola ou no trabalho.
De fato e remontando às nossas aprendizagens podemos verificar que o que nos foi sendo passado ao longo dos anos pode ser um pouco contraditório. Ora vejamos, com frequência ouvimos dizer “ aprende a confiar nos teus sentimentos e a seguir o teu coração” ao mesmo tempo que ouvimos também “não sejas demasiado emotivo/a ou irracional”. Assim, perceber e integrar estes ensinamentos nos assuntos do dia-a-dia e na direção a dar às relações não é de todo uma tarefa simples.
É também compreensível que muitas pessoas, sem a aprendizagem ou conhecimentos necessários para lidar com as “tempestades emocionais”, possam ser levadas a crer que a melhor forma será de fato controlá-las, podendo tornar-se exímias “problem solvers”, usando de forma recorrente a razão como via para resolver a maioria dos assuntos.
Para percebermos a ancestralidade deste debate relembremos o que já nos dizia Aristóteles: “Toda a gente pode ficar zangada, isso é fácil, agora ficar zangado com a pessoa certa, na medida certa, no tempo certo, pelo propósito adequado e da forma adequada, isso sim já não é tarefa fácil. Pois isso envolve integrar coração e razão.”
Algo que nos pode ajudar nesta reflexão é saber que “Emoção” e “Pensamento (razão)” são fenómenos diferentes e que a nossa grande complexidade enquanto seres humanos é termos exatamente estas duas partes dentro de nós, este “eu emotivo” e este “eu racional” que não estão necessariamente de acordo a maioria das vezes estando até muitas delas, em conflito.
A nossa parte mais racional é constituída pela parte mais refletida, mais deliberada. Esta parte contempla as nossas crenças, deveres e julgamentos e ainda ideais transmitidos e que acabam por estar presentes nas escolhas de objetivos. Esta parte é usada para a planificação de assuntos do dia-a-dia e para a antecipação do futuro.
A parte mais emocional é uma parte mais automática, deriva de um monólogo interior mais sensorial e experiencial, mais impulsivo e mais delicado. Esta parte incorpora as nossas avaliações e valores morais pro-sociais.
Estas duas partes de nós, a “nossa emoção” e a “nossa razão” são duas vozes distintas, e estão ambas acessíveis à consciências, mas uma comunica mais em palavras e a outra através dos canais sensoriais do nosso corpo. Desta forma é como se fossemos sobretudo movidos pela nossa emoção e guiados pela nossa razão.
O trabalho essencial da psicoterapia consiste precisamente em poder ajudar as pessoas a conseguirem lidar com as suas emoções de forma mais efetiva, sendo que este trabalho enriquecedor consiste exatamente em colocar estas nossas duas partes, a parte emocional e a parte racional a dialogar de forma útil e produtiva, trabalhando-se no sentido da integração da emoção e da cognição, usando-se a cognição para dar sentido à emoção.
O que se pretende e que é tarefa complexa é ajudar as pessoas a ficarem cada vez mais familiarizadas no processo de identificação e diferenciação das suas emoções, ajudar à diferenciação dos sentimentos individuais dos sentimentos dos outros e ajudar à síntese de emoções que surjam primeiramente como contraditórias.
Pretende-se assim ajudar as pessoas a usarem as emoções como informação para ser “lida” e percebida, para que os sentimentos e emoções possam ser articulados em palavras e símbolos, para que assim, depois de entendida a emoção, possa ser usada na medida mais certa da pretendida em determinado contexto.
Desta forma, e de acordo com este diálogo necessário entre emoção e razão vai-se tornando mais simples percebermos com quem estaremos zangados em determinado momento, zangando-nos na medida mais ajustada, conseguindo-se assim expressar essa zanga no tempo e contexto mais acertado e da forma mais adequada.