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Começar de novo

por oficinadepsicologia, em 09.09.12

Autora: Filipa Jardim Silva

Psicóloga Clínica

www.oficinadepsicologia.com

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Filipa Jardim Silva

Paro, olho à volta e demoro uns segundos até que a visão deixe de ficar turva. Sinto-me como se tivesse sido atropelada por um camião em câmara lenta. Cinco caixotes e duas malas é o que ocupa três anos da minha vida. 1095 dias reduzidos a tão pouco espaço físico, mas arquivados numa biblioteca imensa dentro do meu espaço psicológico. As coisas pesam pouco, as recordações pesam toneladas. Fecho os olhos à espera que por um segundo esteja a ter um pesadelo, mas depressa o eco de sons nesta casa vazia me puxam para a realidade. Acabou. O amor juntou-nos, o amor separou-nos. Filmes em sucessivo correm dentro da minha cabeça: filmes de amor, de suspense, de terror, de drama por fim. Tivemos tudo, terminámos no nada, quando as palavras se esvaziaram, quando nos perdemos de nós.

 

O Sol invade o meu espaço sem pedir autorização, recorda-me que começou um novo dia, quase a gritar-me que também eu estou a começar uma vida nova. Empurro-me até a um banho frio que me acorda para o momento presente. Limpo as lágrimas, visto-me e arregaço as mangas. Os músculos estão fracos, a mente trémula, mas tudo se treina e fortalece. É tempo de começar de novo no dia de hoje com intervalos para chorar o ontem e instantes para sonhar o amanhã. Não tenho resposta a todos os porquês mas também não ambiciono ter. Fecho a porta aos “se’s” que se atropelam uns aos outros. Guardo o que há bom de guardar, e a cada dia que passa a respiração serena, o sono acalma e o apetite volta. Por uma história de amor não ter um final feliz não significa que foi um fracasso. Recuso-me a sintetizar três anos da minha vida a uma palavra como falhanço. Todas as gargalhadas que dei foram magia pura, todas as partilhas cúmplices conquistas, todas as aprendizagens feitas são heranças eternas que nem o tempo nem gente podem apagar. Ninguém me tira o amor que vivi mas também ninguém me pode puxar para a vida novamente, apenas eu. É tempo de recomeçar. Voltar a preencher os dias de maneiras distintas, descobrir sítios até agora desconhecidos, viajar sozinha, carregar sacos pesados, dar espaço a novas pessoas. Não é uma vida a substituir a outra, é uma nova vida. Passado algum tempo recordo com um sorriso a história vivida e sim, há noites chuvosas que me levam a derramar uma lágrima de nostalgia sobre o que foi e mais ainda podia ter sido. Mas o dia amanhece e revigora a alma, para esta que é mesmo uma vida nova. Estou agora numa relação comigo mesma, e como em qualquer início de relação estou a descobrir-me, a mimar-me, a tentar surpreender-me, à procura das palavras que me fazem brilhar o olhar, dos sítios que me aquecem a alma, dos cheiros que me arrepiam, dos sabores que me extasiam.

 

Esta é a história da Alice que podia chorar o ontem mas estaria a enevoar a visão do hoje e a bloquear o amanhã. Podia lamentar o que não resultou e até quiçá procurar culpados, mas estaria a reduzir uma história de amor a um desencontro final. Podia designar-se de pouco afortunada mas nunca gostou de rótulos. Preferiu arrumar a bagagem das viagens passadas e seguir com uma mochila leve no presente. A Alice não é mais que ninguém e conhece bem as suas fragilidades, mas desde que saiba que merece e quer ser feliz, tem as coordenadas necessárias que a orientam por entre as tempestades e conduzem a oásis perdidos. Porque é sempre possível começar de novo.

publicado às 11:01


4 comentários

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De Tânia a 09.09.2012 às 11:54

Como eu entendo tão bem a Alice... :-( Os recomeços são tão necessários, mas tão difíceis... Especialmente quando há um filho...
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De dalila a 11.09.2012 às 11:46

tao verdade. tao simples tao unico...tao dificil. é a historia dela, podia ser a minha. foi a minha, multilicando mais anos. e foi muito bom mm. tao bom que se tem medo de avançar. obg
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De Ana Rita a 12.09.2012 às 18:44

Atrever-me-ia a dizer que, em algum momento das suas vidas, praticamente todas as mulheres foram, sentiram e viveram "Alices"....E a vida delas tem mesmo que continuar, a busca da felicidade continua, e não são "Alices" novas, mas sim, "Alices" diferentes....
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De TADEU a 17.10.2012 às 18:09

E.. CONTAR UMA HISTORIA DE FINAL QUE DEU CERTO, TUDO BEM. E QUANDO O DESESPERO FERE, MACHUCA, DESTROI, JOGA NO CHAO E SO FALTA MATAR DE TANTA DOR POR DENTRO ? O QUE FAZER QUANDO A VIDA PERDE O BRILHO, O RUMO, O ESTIMULO, QUANDO NAO SE TEM FORCAS PARA MAIS NADA ?
O QUE FAZER, QUANDO O SENTIDO DA VIDA SE FOI ?
QUE AMIGOS ? QUE CIRCULOS ? QUE FAMILIA, QUEM PODE AJUDAR ALGUEM QUE SE DEDICOU TANTO TENTO E EXCLUSIVAMENTE A ALGUEM, E ELA VAI EMBORA ???
O QUE FAZER, QUANDO A GENTE ESQUECEU DE TUDO E DE TODOS E DO MUNDO, PARA QUERER VIVER UM AMOR DE REVISTA, DE FILME , DE SONHO ? SE DEDICAR A UMA UNICA PESSOA O TEMPO TODO, COMO SE ELA FOSSE PARTE DA GENTE MESMO, COMO SE FOSSE O PROPRIO AR ..
VAMOS LA ! PELO AMOR A DEUS, QUEM TEM SOLUCAO ? COMO SAIR DESTE INFERNO QUE E VIVER CADA DIA E CADA DIA SEM NADA, NEM NINGUEM, SEM MOTIVACAO PARA NADA MAIS ?

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