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Entre diagnósticos: quem sou eu?

por oficinadepsicologia, em 09.09.12

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Sinto-me tão desiludido com a minha vida, tão desmotivado, tão "desesperançado" que não sei onde fui buscar a ousadia de escrever estas palavras e enviá-las para um desconhecido...
Uma parte de mim diz-me que isto é inútil, que isto é bem capaz de ser interpretado como um inútil "grito por ajuda" e não uma tentativa de esclarecer uma dúvida, mas... aqui vai a minha questão:
Após alguns anos de terapia e de algumas desistências, foi-me diagnosticado um distúrbio de personalidade evitante. Algo que começou com uma "simples falta de aptidões sociais" passou a "distemia" depois foi "fobia social" e agora é a minha própria personalidade que está "danificada" (é uma perspectiva assustadora)... por razões que não vou referir aqui, desisti, mais uma vez, da terapia que andava a fazer (ou a tentar fazer) e agora sinto que não tenho forças para voltar a tentar novamente. Sinto-me sozinho nesta luta... já li bastante acerca de distúrbios da personalidade mas não encontrei nada acerca de possíveis formas de lidar com um problema destes sem envolver psicólogos e/ou psiquiatras. Por isso aqui estou a perguntar-lhe se a psicoterapia é a única abordagem capaz de ajudar-me a "reparar" (ou pelo menos "remendar") a minha personalidade?


Caro L.,

antes de mais agradecemos a sua partilha, e enaltecemos a coragem inerente à mesma. As suas palavras foram interpretadas como uma tentativa de procurar informação com vista a perceber por onde caminhar, que recursos buscar, que ferramentas utilizar.

Antes de mais, parece pertinente referir que mais do que rótulos e diagnósticos atribuídos por um dito especialista, importa pensar o processo psicoterapêutico como um espaço seguro, de aceitação e contenção, onde se estabelece uma relação de confiança entre duas pessoas, psicoterapeuta e cliente, sendo que os papéis são diferenciados mas a posição em que ambos assentam é a mesma, são dois seres humanos que à luz da sua subjectividade individual procurarão partilhar conteúdos com um objectivo de mudança: o cliente partilha aspectos da sua vida que lhe parecem importantes poder pensar mais aprofundadamente e de outras perspectivas, o terapeuta recebe e devolve material recorrendo ao seu enquadramento teórico, a construtos de teorias psicológicas e técnicas psicoterapêuticas, mas sendo o seu filtro a sua subjectividade pessoal, o cliente recebe e volta a devolver informação e é esta (meta)comunicação e partilha que se assumem como os motores da mudança desejada.

Outro aspecto relevante passa pelo foco da mudança pretendida: só necessitará alterar/optimizar os aspectos da sua personalidade que interferirem com o seu bem-estar, qualidade das relações pessoais e integração saudável na sociedade, nunca perdendo de vista a sua individualidade. Não existem duas pessoas iguais, e todas as características pessoais devem ser integradas e pensadas numa lógica de espectro e não de um ponto único de normalidade vs patologia. Existirão pessoas mais inibidas e introvertidas e outras mais extrovertidas e sociáveis.
Assim, importará se calhar nesta fase clarificar para si os aspectos da sua personalidade que de alguma forma têm interferido de forma negativa na sua vida e estruturar focos de mudança. A partir destes focos pode motivar-se a fazer pequenas alterações na sua rotina diária ou a ter algumas iniciativas que lhe pareçam facilitar a mudança desejada. Alguns desses passos podem revelar-se demasiado difíceis e a viagem pode ser sentida como sendo demasiado árdua para ser feita de modo solitário; se assim for, pode ter encontrado a motivação certa para iniciar um novo processo psicoterapêutico, mais objectivo e centrado, e talvez assim menos propenso a desistências.

Se de algum modo sentir que podemos ser útil nesse processo de mudança estaremos disponíveis para colaborar consigo.

Um abraço,
Filipa Jardim da Silva
Oficina de Psicologia

publicado às 16:35


13 comentários

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De A. a 20.11.2012 às 10:44

Peço desculpa por querer manter o anonimato, mas sinto-me mais segura desta forma. Recentemente descobri que sofro do mesmo mal. Fiz Psicanálise na tentativa de encarar melhor esse sentimento de inadaptação, mas sem sucesso. Penso que só agora, quando me autodignostiquei, lendo preto no branco, aquilo que realmente sentia e os meus verdadeiros obstáculos no relacionamento comigo mesma e com os outros, é que me apercebi que ainda posso ter esperança. Sei que 90% parte da minha cabeça, e Deus sabe como me esforço por contrariar. Mas a verdade é que me sinto diferente. Às vezes o termo "ave rara" encaixa-se na perfeição. Se há momentos onde não me importo com isso e até me sinto "segura", outros há onde me sinto completamente "posta de parte", sem motivo que entenda como válido, sem perceber sequer porquê.
Gostava de saber se o L. encontrou algum mecanismo de defesa, para lutar contra isto, e que tipo de terapia tentou. Tenho 35 anos e gostava de finalmente me sentir segura de mim mesma.
Obrigada,
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De L. a 21.11.2012 às 19:49

Eu não sou a pessoa mais indicada para dar concelhos acerca deste tema porque eu próprio estou a “afundar-me”… Comecei a fazer psicoterapia em 1999 e desde então já fui acompanhado por várias psicólogas, psicólogos e psiquiatras (não continuamente) mas… apesar de tanta terapia, ainda não consegui ganhar: coragem, determinação, força de vontade e/ou aptidões suficientes para vencer esta minha “inércia”… Lamento mas acho que não tenho um bom conselho para dar a quem sofre com um Distúrbio de Personalidade Evitante…

Relativamente à terapia mais indicada para um distúrbio deste tipo, acho que a escolha de um psicoterapeuta, que tenha bastante experiência no tratamento de distúrbios de personalidade, é mais importante do que a escolha do tipo de terapia. Aliás, a melhor abordagem terapêutica só pode ser feita conjuntamente com um psicoterapeuta e só após a realização de um diagnóstico exaustivo. O auto-diagnóstico pode ajudar mas é um erro assumir que somos capazes de obter uma visão geral dos nossos problemas sem sermos imparciais e objectivos, em especial quando andamos deprimidos e com “maus pensamentos”.
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De L. a 24.11.2012 às 22:31

No meu comentário anterior tenho um erro! Onde está escrito "...obter uma visão geral dos nossos problemas sem sermos imparciais e objectivos..." devia estar "obter uma visão geral dos nossos problemas de forma imparcial e objectiva..." Parece que a minha concentração também anda em baixo...
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De A. a 27.11.2012 às 16:42

L., Agradeço a sua honestidade e aconselhamento. Ainda estou numa fase de cepticismo e de achar que por mim mesma consigo "dar a volta". Mas a verdade é cada vez me sinto mais "inapta". E se há dias que sinto ter força e mudar um pouco a minha postura de "autodefesa" e sair do buraco, outros há, em que cada dia se arrasta penosamente, estando sempre desejosa de chegar a casa para me sentir, finalmente, sem o peso dos "outros".
Se houver algum terapeuta que me recomende aqui na área de Lisboa, aceitarei a sugestão.
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De oficinadepsicologia a 08.01.2013 às 23:19

Agradeço a vossa partilha honesta.
Na nossa equipa alargada de psicólogos, com especializações, tipos de experiências profissionais e formações teóricas distintas encontrará certamente um profissional apto e motivado a ajudá-la. Porque o processo psicoterapêutico é um caminho feito a dois e baseado numa sólida e segurança aliança terapêutica, sinta-se à vontade para em qualquer altura agendar uma primeira consulta de psicoterapia sem qualquer compromisso. Se sentir que não é com aquela pessoa ou não é o momento, não fica com qualquer obrigatoriedade de voltar. Mas se lhe fizer sentido e lhe parecer que pode construir um início de uma jornada rumo à mudança atire-se de cabeça. Dê uma oportunidade a si própria de derrotar o cepticismo e as barreiras que a têm mantido prisioneira de si. Quer seja connosco ou com outro técnico, dê esse passo.

Um abraço com força
Filipa Jardim da Silva
Oficina de Psicologia
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De Agatha a 15.06.2013 às 02:59

Gostaria de dizer que também descobri há pouco tempo ter transtorno de personalidade Evitante e Obsessivo-Compulviva, com traços de personalidade dependente devido à evitação... Além disso tenho hiperlexia. Pode acreditar, a melhor saída virá de quando você resolver não ter medo de enfrentar, não o que você é, mas o pensamento de evitar descobrir quem pode ser se puser as cartas na mesa, detalhas e escandir quem você é - afinal ninguém melhor pra conhecer TUDO sobre você mesma; coisas aquelas que não dividimos com ninguém por mais íntimo que chegue a ser - e decidir o que quer manter, o que é aspecto SEU; e atitudes e reações, principalmente, como também percepções e interpretações, essas que não sabemos se são reflexo de nossa condição patológica ou "correta", "real", pontos de vista embasados nas crenças próprias que nos enraizaram a condição de ver tudo sob esse ângulo, ou se são pontos de vista que, embora não sejam aceitos pela sociedade, ainda seriam assim recebidos por eles caso fôssemos "normais", inteiros, comuns, e se acreditarmos que queremos manter essas convicções, e separá-las dessa outra parte, porque é é direito nosso mantê-las. Achei bastante esclarecedora a resposta a você, quando afirmou que você deve modificar apenas o que lhe faz mal e prejudica seu bem-estar. Pode acreditar, calar e aceitar fazer coisas que lhe prejudicam não faz bem nenhum, eu sei disso muito bem porque aceito passivamente situações que me desconfortam, vomito, me auto-flagelo, auto-mutilo, tenho tensão ansiosa e vomito bastante, tenho momentos depressivos e tive minha terceira tentativa de sicídio, a última concreta e quase bem-sucedida. Foi um pedido de socorro. Tenho apenas 20 anos que completei no mês passado, e estou iniciando psicoterapia agora. Acredite, meu pavor é tremendo de não saber o que me espera, ainda mais porque sou obsessiva-compulsiva. Não ser completa e não ter controle sobre mim e conhecer aspectos que me eram tomados como meu eu de repente serem aspectos de uma "condição" não me deixaram tranquila, ainda mais porque sou extremamente ansiosa, e não vou nem um pouco com a cara do meu psiquiatra. Mas minha terapeuta me faz sentir bem segura, apesar que demoro muito a confiar nas pessoas, mas ando esperando que elas supere minhas expectativas porque somente confiando muito nela terei alívio para prosseguir sem tensão na jornada de não sofrer com inaptidões minhas que tentarei solucionar, ser adulta, ter autonomia, e não deixar de ser altamente empática com todas as pessoas, porque aprovo muito esse comportamento em mim, e gostaria de superar apenas a incapacidade de negar e expor minha vontade e defendê-la ainda diante desse entendimento do lado do outro. Sou quaker e não gostaria de excluir meus aspectos que acredito serem virtudes quando todos os condenam e não os recebem bem; mas será meu desafio aceitar que nem todos vão gostar de mim e que isso deve ser natural, e que não preciso dessa condição para conseguir o que desejo. Me falta apenas aprender a pôr isso em prática. Mudei de casa, estou morando com meus avós que me proporcionam um ambiente de mais paz embora não saibam ainda da minha condição, e embora nos fins de semana quando sei que meu pai virá eu ainda comece a vomitar e sofrer com crises de ansiedade e tensão, pretendo superar a reação doentia que sua presença me provoca e a culpa por me sentir assim em relação a uma pessoa que não tem culpa de seu comportamento patológico ainda não especificado, provavelmente bipolar. Ter qe continuar me submetendo e me culpando é muito destrutivo, e espero mudar isso. Ser capaz de resistir é uma habilidade, e preferir não fazê-lo deve ser uma escolha, não resultado de patologia causando destruição e mal estar. Torna-se altruísmo, abnegação. Não incapacidade. Amar de modo saudável tem de ser pregado e exercido. Espero que você consiga e seja muito feliz, de verdade mesmo, com sinceridade. Amo você especialmente por termos algo em comu, por mais que não seja algo comum. Sei como você é e como se sente. E você não está sozinha, porque mesmo sem conhecê-la, eu a conheço em partes de nossa personalidade semelhantes, e confie, eu gosto de você. Você merece sim ser feliz, e só depende muito de você começar a tentar. E não tenha pressa, você saberá como.

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