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Os pontos fixos no nosso mundo

por oficinadepsicologia, em 13.09.12

Autora: Vanessa Damásio

Psicóloga Clínica

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Vanessa Damásio

Observo que procuramos constantemente um ponto fixo, um ponto de equilíbrio, algo que nos mantenha seguros, no meio de um mundo repleto de mudanças, transformações, ou melhor, transições. Tal significa que realizamos passagens de um estado, forma ou local para outro distinto e não obrigatoriamente pior ou melhor. Dão-se constantes transições a todos os níveis da nossa vida, e inclusivamente, se repararmos bem, nem no próprio universo temos um domicílio fixo: o planeta terra viaja pelo espaço a vários quilómetros por segundo, mudando a sua posição de segundo a segundo, sendo que num segundo estamos ali, e noutro acolá, sem sequer termos consciência disso! As estações do ano seguem-se umas às outras de forma cíclica: Primavera, Verão, Outono e Inverno; e até a o estado da água pode passar por diferentes transformações segundo a temperatura e pressão do contexto, passando de líquido a sólido ou gasoso e vice-versa.

 

Mas uma das transições mais difíceis de aceitar será quiçá a das etapas do ciclo da vida. Passamos a vida a tentar encontrar a estabilidade nas famílias e relações, na carreira, na localização e até no universo, e muitas vezes não conseguimos digerir as passagens da idade e do tempo, principalmente a nível pessoal e familiar. A nível pessoal é de destacar o quão por vezes é difícil passar da fase infantil à adolescência e desta à fase adulta. Em cada nova fase temos que nos readaptar, transformar e reconstruir, passando por metamorfoses como se de borboletas nos tratássemos.

 

A nível familiar e relacional verificam-se diversos eventos naturais que, necessariamente provocam mudanças na organização do sistema familiar, que podem ser previsíveis, como por exemplo o casamento, ou imprevisíveis e que alteram o tempo e as funções da família, de forma a modificar o ciclo vital, como por exemplo a morte precoce ou a gravidez na adolescência.

 

A cada transição de fase do ciclo vital, a família deve enfrentar uma situação nova, que põe em cheque as antigas modalidades de funcionamento, necessitando uma nova ordem familiar.

Cada transição pressupõe assim uma certa forma de crise, mais ou menos intensa para cada indivíduo e sistema familiar em que se encontra. O problema está precisamente quando o indivíduo e suas relações não se conseguem adaptar às crises e mudanças, e quando a razão e a realidade se misturam com emoções negativas e frustrações permanentes.

Onde está o nosso ponto fixo, um “porto seguro” e reconfortante, no meio deste universo de transformação constante?

Quero acreditar que a resposta reside na capacidade que dispomos para olhar para o nosso interior, para a nossa mente e mentes que nos rodeiam, e se necessário pedir ajuda a uma relação que nos dê amor, valor e carinho, a um amigo ou familiar, ou quiçá a um psicólogo! Porque a psicologia é para todos e poderá ser esse mesmo ponto fixo que nos ajuda a superar uma transição que nos bloqueia o crescimento.

publicado às 10:58

O fim das férias e a depressão

por oficinadepsicologia, em 12.09.12

Autora: Cristiana Pereira

Psicóloga Clínica

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Cristiana Pereira

Como assim depressão e férias!? À primeira vista são duas palavras que não se relacionam! Quem nunca passou pela experiência de quase ter um ataque só de lembrar que as férias acabaram e vai começar tudo de novo?

O mal-estar e o desânimo aparecem quando a data de regresso ao trabalho se aproxima. Podem surgir insónias, ansiedade, tristeza e irritabilidade e os sintomas depressivos ocorrem.

 

A depressão pós férias não é mais do que uma depressão reactiva a um acontecimento desagradável. Voltar ao ritmo de trabalho é uma tarefa difícil para o nosso organismo, assim como desabituar-nos das obrigações laborais e do ritmo profissional acelerado.

É natural que, no início das férias, algumas pessoas experimentem nos primeiros dias sensações de ansiedade e angústia pela mudança de ritmo. O nosso cérebro e o nosso corpo precisam de tempo para adoptar outro ritmo de vida. O não ter horas para se levantar, as refeições em horários diferentes, o não sentir a pressão do telefone ou do chefe, são factores que levam algum tempo a serem interiorizados.

Da mesma forma, voltar ao ritmo de trabalho pode tornar-se angustiante nos primeiros dias ou, para alguns, esta angústia surge uns dias antes por antecipação daquilo que o espera, ou seja, a mudança de ritmo novamente.

 

Para que o regresso ao trabalho não seja algo tão penoso, deixo-lhe algumas estratégias para amenizar o regresso ao trabalho:

  • Se vai viajar ou passa férias fora de casa, nunca volte na véspera de retornar ao trabalho. O choque é maior para o seu cérebro e para o seu corpo.
  • Se puder faça férias repartidas. As férias prolongadas aumentam essa sensação de desprazer ao voltar. O ideal seria fazer férias duas a três vezes no ano.
  • Volte três a quatro dias antes e comece a levantar-se mais cedo progressivamente nesses dias para que se habitue a um novo horário.
  • Pratique actividades físicas e de lazer, além de actividades sociais prazerosas.
  • A carga de e-mails e de problemas pendentes será menor se puder encarregar alguém que o possa ajudar; caso contrario, faça uma lista de prioridades e comece pelos projectos que não foram concluídos antes das férias.
  • Evite marcar reuniões e outros compromissos muito importantes para a primeira semana.

 

O regresso ao trabalho sem qualquer preparação pode causar uma extrema produção de cortisol (hormona do stresse), mudanças na taxa glicémica, alterações de pressão, tensão muscular, problemas digestivos, taquicardia e até desencadear um processo de depressão. Quando os sintomas se recusam a ir embora, então é porque algo não está bem. Podem persistir os sintomas de cansaço, insónia, irritabilidade, angústia ou tristeza e, nesta altura, é recomendado perceber junto de um profissional qual o problema.

publicado às 10:47

Famílias adoptivas

por oficinadepsicologia, em 11.09.12

Autora: Inês Mota

Psicóloga Clínica

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Inês Mota

Através das histórias de conhecidos e amigos bem como pelas imagens e histórias transmitidas pelos meios de comunicação social, relativas às vidas e decisões das figuras públicas, deparei-me com uma expressão e visibilidade crescente relativamente às famílias adoptivas.

Por saber que estas famílias conhecem e atravessam desafios difíceis, pareceu-me pertinente partilhar convosco etapas e fases cruciais relativas ao desenvolvimento destas famílias.

 

As famílias adoptivas são constituídas por famílias de pais e filhos que não tendo uma ligação biológica estão ligadas por laços afetivos ou legais.

Segundo Rosenberg, a família adoptiva nasce com a chegada da criança e esta etapa constitui-se como fase primordial na qual irá ser estabelecido o vínculo entre pais e filhos, que será tanto mais difícil quanto mais avançada a idade da criança, visto, nestes casos, já estar estabelecido um modelo interno de vinculação.

 

Palácios, com o intuito de avaliar o nível de risco que pode caracterizar a família adoptiva propõe um modelo em que cruza factores de risco relativos aos pais adoptivos e factores de risco relativos aos filhos adoptivos. Assim, explicita que contribuem para o nível de risco dos pais, expectativas inadequadas, pouca capacidade em lidar com o conflito e a tensão, atitudes pouco comunicativas, pouca expressão de afeto e escassez de apoios sociais e profissionais e para os factores de risco dos filhos, a elevada idade de adoção, a institucionalização prolongada, história prévia de conflitos graves e presença de problemas sérios de comportamento.

 

Todas estas questões poderão emergir durante o processo de adopção e ao longo do ciclo vital destas famílias e é importante que estas famílias consigam recorrer ao apoio da família alargada, social e mesmo apoio técnico.

 

Uma das dificuldades que os pais podem sentir com filhos pequenos diz respeito ao desenvolvimento de uma autoridade e disciplinas eficazes, por exemplo, por medo de não conseguirem o afeto da criança ou por receio de serem muito duros devido ao passado da criança.

 

Uma tarefa importante a realizar na idade escolar, quando a criança já é mais capaz de compreender cognitivamente o significado de adopção, será exatamente a veiculação da notícia, pois o segredo é destrutivo na estrutura familiar. Após a revelação é importante apoiar a criança a compreender esta realidade, pois esta poderá realizar nesta altura confabulações relativas aos motivos de adopção, por exemplo, assumi-la como retaliação pelo seu comportamento, podendo assim emergir problemas escolares, dependência emocional ou comportamentos agressivos ou de desafio, de forma a testar a garantia e disponibilidade do amor dos pais.

 

A adolescência nestas famílias constitui-se como um dos períodos mais difíceis, pois pode nascer no adolescente o desejo de ligar as várias partes da sua história de vida e assim querer conhecer a sua família biológica e raízes geográficas, sem que isso signifique que queira deixar a sua família adoptiva. No entanto, estas são tarefas dolorosas que despertam medos e angústias na díade de pais e filhos.

 

Apesar das tarefas difíceis explicitadas que estas famílias atravessam, segundo Relvas, observa-se que relativamente ao nível de coesão e adaptabilidade não se registam diferenças significativas relativamente às famílias biológicas, visto haver um grande investimento na coesão por parte das famílias adoptivas para fazer nascer a família, por saberem que a coesão não germina espontaneamente, sendo também que a maior parte das famílias adoptivas revela satisfação pela adopção, caracterizando-se como famílias funcionais.

 

Fonte: Alarcão, M. (2000), (des)Equilíbrios Familiares, Quarteto, Lisboa

publicado às 16:41

Famílias alcoolicas

por oficinadepsicologia, em 10.09.12

Autor: Gustavo Pedrosa

Psicólogo Clínico

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Gustavo Pedrosa

 

O Alcoolismo (dependência e abuso do álcool) representam um dos maiores problema de saúde publica, que tem atingindo diversas gerações. Como em muitos outras patologias, o alcoolismo é vivenciado pelo individuo e, segundo a perspectiva sistémica, também pela sua família, designando-a de família alcoólica.

O alcoolismo surge, muitas vezes, como estratégia de resolução de dificuldades que o alcoólico encontrou para fazer face ao seu sofrimento, à sua dor mental. Mas o alcoólico leva consigo os elementos do seu sistema familiar para um processo circular, que consome recursos e esforços.

Este forte poder organizacional do álcool cria um elevado sofrimento psicológico em todos os membros da família, especialmente pela dificuldade em encontrarem meios adequados para exprimirem ou formularem um pedido de ajuda.

 

Mas, como se identifica afinal um problema de alcoolismo?

Quando o consumo de álcool escapa cada vez mais ao controlo do individuo, cria-se uma ligação vital ao álcool e aos seus efeitos. Existe então uma perda de controlo sobre o álcool e também sobre a sua vida, levando o alcoólico a controlar o meio para manter os padrões de ingestão.

 

Como afecta a família?

A organização familiar gira em torno do alcoolismo. Assim, a família deixa de se centrar na satisfação das necessidades dos seus membros, passando a orientar-se na manutenção da relação do consumidor com os seus consumos.

Perante isso, o sistema familiar tenta reequilibrar-se, procurando uma vivência em que os papeis e padrões relacionais sobrepõem-se à necessidade dos membros da família. Assim, a família modela o ambiente, capacidades, crenças, valores, identidade e até mesmo a pertença e dependência a esse sistema.

Cria-se então uma perturbação no relacionamento entre o individuo e os seus envolventes. O álcool passa a ser um elemento adaptativo que contribui para a manutenção deste “equilíbrio” da família, e que, pela sua presença, se opõe a qualquer mudança, promovendo a disfuncionalidade.

 

 

 

 

Co-Dependência:

Toda a família fica dependente do álcool. Mas há algumas famílias que resistem à invasão do álcool, pois não aceitam ou rejeitam o comportamento aditivo, levando à rotura conjugal. Assim, o primeiro passo para uma família alcoólica acaba por ser o comportamento do cônjuge , que necessita de aceitar a adição.

 

Na família alcoólica criam-se algumas “REGRAS DISUNCIONAIS”. Essas regras, não estando claras ou explicitas, são criadas, mantidas e vivenciadas por todos os elementos da família. Essas regras são:

 

1 – Regra da Negação: consiste na atitude de banalização, racionalização, de distorção da informação, de ameaças, sedução e confusão hierárquica que ocorre na família. Os estímulos são seleccionados, modificados ou excluídos, e o seu significado alterado ou ignorado, o que impede a resolução do problema. A Negação do problema leva ao bloqueio da pessoa com informação, pois ela não a revela ou faz uso dela.

Surgem então os segredos familiares, que consistem na paralisação da história e evolução da família, moldam as relações, claras ou encobertas, as divisões, as rupturas e definem os limites. São factos que toda a família conhece, mas que cada qual acredita que é o único, ou um dos únicos a sabe-lo, não sendo por isso nunca falados. Encobrem o significado e a consequência do comportamento disfuncional (beber) e distorcem a comunicação na família, bloqueiam as interacções dos seus membros e retiram a confiança.

É proibido saber e é proibido esquecer o segredo.

 

2 – Regra do Silêncio:

É uma causa e uma consequência, em que a nomeação das necessidades próprias, desejos, emoções e sensações está pouco presente.

A expressão verbal relativa ao que  cada um compreende e sente é muito limitada e a expressividade inibida. Existe o medo de falhar, de se enganar, não havendo palavras credíveis, e a dúvida instala-se.

As interacções são negativas e centradas na censura, o que favorece a vergonha e culpabilidade.

 

3 – Regra do Isolamento:

Os elementos familiares aprendem a não interagir uns com os outros (sejam da mesma geração ou entre gerações).

A crise, quando surge, pode ser salutar, servindo para pedir ajuda e manifestar alguma abertura recorrendo a intervenientes exteriores (vizinhos, autoridades, médico, psicólogo, urgência...).

 

4 – Regra da Rigidez:

Aqui surge simetria de comportamentos, ou seja, as relações são baseadas num comportamento similar (em espelho). O reforço de um comportamento de um elemento, reforça o comportamento semelhante do outro, e assim se minimizam as diferenças.

 

Surge também comportamentos de complementaridade, ou seja, a relação baseia-se na diferença; o comportamento de um ajusta-se ao comportamento do outro.

 

Ao nível relacional, o alcoólico caracteriza-se pela excessiva simetria. Os hábitos de beber pela rivalidade e pela semelhança – beber tanto quanto o outro, cada um paga uma rodada e mostrar ao outro que se é tão capaz quanto ele.

Assim, quanto mais o sistema repete que deve parar de beber, mais o alcoólico quer provar a sua força em resistir. Quanto mais o alcoolismo se agrava, mais a família tende a complementar, exercendo autoridade e protecção. 

A mudança na família pode surgir do co-alcoólico, que começa a ter em conta as suas necessidades, os seus desejos, deixando de estar orientado para as necessidades do alcoólico.

Podem surgir assim comportamentos de controlo dos consumos por parte do cônjuge, havendo quase como uma infantilização do alcoólico, que fica sem poder se decisão.

 

No alcoolismo a Intervenção Terapêutica centra-se, inicialmente, na criação de um sistema terapêutico.

Tem que ser feita uma análise da cultura familiar, padrões, estilos, costumes, segredos, mitos e problemas. Há então que compreender como se articulam os factores que bloqueiam a historia familiar e criar uma historia familiar onde o alcoolismo não constitua o ponto central de todas as relações familiares.

O terapeuta terá que demonstrar que equilíbrio familiar é possível e que a mudança não implica o caos.

Terapêutica introduz no sistema conteúdos relacionais com os seus próprios modelos, significados e sistemas de relação.

Há que haver cuidado especial na desintoxicação, que poderá levar à depressão, tanto no alcoólico como no cônjuge.

Por fim há que explorar a função do álcool nas problemáticas do casal e do individuo.

 

O processo tem em conta alguns condicionalismos, como:

a) Eventualidade de uma separação;

b) Autonomia dos filhos;

c) Dificuldade do casal na expressão de afectos e emoções;

d) Capacidade de viverem como um casal sem um terceiro elemento;

e) Medo do alcoólico ser engolido pela “família perfeita”.

 

 

Concluindo, é fundamental reconstruir as relações com os outros, com a família, com o terapeuta e resolver os assuntos inacabados (segredos). Promovem-se assim as narrativas com mais proactividade, que possibilitem conviver de forma mais gratificante, saudável e autónoma.

 

Baseado em:

Pires, U. (2009). A família com um membro adulto alcoólico. Mosaico, 43, 36-42.

publicado às 12:20

Entre diagnósticos: quem sou eu?

por oficinadepsicologia, em 09.09.12

E-mail recebido

 

Sinto-me tão desiludido com a minha vida, tão desmotivado, tão "desesperançado" que não sei onde fui buscar a ousadia de escrever estas palavras e enviá-las para um desconhecido...
Uma parte de mim diz-me que isto é inútil, que isto é bem capaz de ser interpretado como um inútil "grito por ajuda" e não uma tentativa de esclarecer uma dúvida, mas... aqui vai a minha questão:
Após alguns anos de terapia e de algumas desistências, foi-me diagnosticado um distúrbio de personalidade evitante. Algo que começou com uma "simples falta de aptidões sociais" passou a "distemia" depois foi "fobia social" e agora é a minha própria personalidade que está "danificada" (é uma perspectiva assustadora)... por razões que não vou referir aqui, desisti, mais uma vez, da terapia que andava a fazer (ou a tentar fazer) e agora sinto que não tenho forças para voltar a tentar novamente. Sinto-me sozinho nesta luta... já li bastante acerca de distúrbios da personalidade mas não encontrei nada acerca de possíveis formas de lidar com um problema destes sem envolver psicólogos e/ou psiquiatras. Por isso aqui estou a perguntar-lhe se a psicoterapia é a única abordagem capaz de ajudar-me a "reparar" (ou pelo menos "remendar") a minha personalidade?


publicado às 16:35

Começar de novo

por oficinadepsicologia, em 09.09.12

Autora: Filipa Jardim Silva

Psicóloga Clínica

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Filipa Jardim Silva

Paro, olho à volta e demoro uns segundos até que a visão deixe de ficar turva. Sinto-me como se tivesse sido atropelada por um camião em câmara lenta. Cinco caixotes e duas malas é o que ocupa três anos da minha vida. 1095 dias reduzidos a tão pouco espaço físico, mas arquivados numa biblioteca imensa dentro do meu espaço psicológico. As coisas pesam pouco, as recordações pesam toneladas. Fecho os olhos à espera que por um segundo esteja a ter um pesadelo, mas depressa o eco de sons nesta casa vazia me puxam para a realidade. Acabou. O amor juntou-nos, o amor separou-nos. Filmes em sucessivo correm dentro da minha cabeça: filmes de amor, de suspense, de terror, de drama por fim. Tivemos tudo, terminámos no nada, quando as palavras se esvaziaram, quando nos perdemos de nós.

 

O Sol invade o meu espaço sem pedir autorização, recorda-me que começou um novo dia, quase a gritar-me que também eu estou a começar uma vida nova. Empurro-me até a um banho frio que me acorda para o momento presente. Limpo as lágrimas, visto-me e arregaço as mangas. Os músculos estão fracos, a mente trémula, mas tudo se treina e fortalece. É tempo de começar de novo no dia de hoje com intervalos para chorar o ontem e instantes para sonhar o amanhã. Não tenho resposta a todos os porquês mas também não ambiciono ter. Fecho a porta aos “se’s” que se atropelam uns aos outros. Guardo o que há bom de guardar, e a cada dia que passa a respiração serena, o sono acalma e o apetite volta. Por uma história de amor não ter um final feliz não significa que foi um fracasso. Recuso-me a sintetizar três anos da minha vida a uma palavra como falhanço. Todas as gargalhadas que dei foram magia pura, todas as partilhas cúmplices conquistas, todas as aprendizagens feitas são heranças eternas que nem o tempo nem gente podem apagar. Ninguém me tira o amor que vivi mas também ninguém me pode puxar para a vida novamente, apenas eu. É tempo de recomeçar. Voltar a preencher os dias de maneiras distintas, descobrir sítios até agora desconhecidos, viajar sozinha, carregar sacos pesados, dar espaço a novas pessoas. Não é uma vida a substituir a outra, é uma nova vida. Passado algum tempo recordo com um sorriso a história vivida e sim, há noites chuvosas que me levam a derramar uma lágrima de nostalgia sobre o que foi e mais ainda podia ter sido. Mas o dia amanhece e revigora a alma, para esta que é mesmo uma vida nova. Estou agora numa relação comigo mesma, e como em qualquer início de relação estou a descobrir-me, a mimar-me, a tentar surpreender-me, à procura das palavras que me fazem brilhar o olhar, dos sítios que me aquecem a alma, dos cheiros que me arrepiam, dos sabores que me extasiam.

 

Esta é a história da Alice que podia chorar o ontem mas estaria a enevoar a visão do hoje e a bloquear o amanhã. Podia lamentar o que não resultou e até quiçá procurar culpados, mas estaria a reduzir uma história de amor a um desencontro final. Podia designar-se de pouco afortunada mas nunca gostou de rótulos. Preferiu arrumar a bagagem das viagens passadas e seguir com uma mochila leve no presente. A Alice não é mais que ninguém e conhece bem as suas fragilidades, mas desde que saiba que merece e quer ser feliz, tem as coordenadas necessárias que a orientam por entre as tempestades e conduzem a oásis perdidos. Porque é sempre possível começar de novo.

publicado às 11:01

Animais de terapia

por oficinadepsicologia, em 08.09.12

Autora: Ana Beirão

Psicóloga Clínica

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Ana Beirão

No passado convivíamos mais com os animais, numa relação mais estreita. A sua presença foi fundamental para situar o homem e suas aspirações em quase todas as culturas, em diferentes épocas e continentes (Dotti, 2005). Acreditava-se que os animais possuíam poderes, eram retratados como seres poderosos, indicando transmutação, protecção, sentimentos básicos humanos e uma certa evolução espiritual. A mudança da perceção pública só começou por volta do século dezassete, na era do conhecimento. Mais tarde surge a noção de que o animal poderia ter uma função socializadora, principalmente com crianças, dando-lhes sentido de responsabilidade e a possibilidade de desenvolverem sentimentos meigos. A compaixão e a preocupação pelo bem-estar dos animais tornou-se um dos temas favoritos e didáticos da literatura infantil, com o propósito de inculcar a ética da bondade e gentileza nas crianças. Posteriormente, começaram a ser aplicadas as teorias relacionadas com a influência da socialização do animal de companhia nos tratamentos de doentes mentais. Os efeitos benéficos do animal de companhia, como ferramenta terapêutica no tratamento da dor, começaram a ser reconhecidos no decorrer do século dezanove. No entanto, e devido ao desenvolvimento da medicina científica, esta ideia foi colocada de parte. Só novamente por volta dos anos sessenta e setenta do século vinte com Boris Levinson, é que o valor do animal como auxiliar do processo de terapia voltava a ter lugar, documentando os efeitos que ajudava a desenvolver na relação entre terapeuta e paciente e no aumento da motivação do paciente.

 

Os animais hoje em dia preenchem uma série de funções na vida das pessoas. O cão, por exemplo, passa a não ter apenas um papel utilitário, mas também um papel social. As necessidades humanas vão variando e com elas nota-se uma crescente mudança nos relacionamentos com os animais de companhia. Alguns autores afirmam que actuam como confidentes sem risco de traição. Além dos benefícios emocionais, que advém da relação dono e animal, ainda podemos verificar uma melhoria da saúde física e mental. Outros autores mencionam que os animais apresentam ao homem, oportunidades diferentes como: apreciar a natureza e a vida selvagem, inspiração e aprendizagem, a brincadeira, o altruísmo, o companheirismo e a criação de laços com outros homens.

 

Levinson foi quem primeiro designou a terapia animal, ao dar valor ao animal como um auxiliar ao processo terapêutico, e que agora é conhecido como terapia assistida por animais. O programa estabelecido é dirigido e avaliado por um profissional de saúde ou de educação, havendo objectivos específicos sejam eles físicos, motivacionais, educacionais e mentais. As teorias que referem os mecanismos responsáveis pelos benefícios terapêuticos, tendem a centrar-se na noção de que os animais possuem características únicas que contribuem e facilitam a terapia, e a ideia do desenvolvimento de uma relação profissional com o animal pode levar a desenvolvimentos cognitivos e comportamentais positivos, através de uma aquisição de novos dotes e a aceitação de uma responsabilidade e acção pessoal.

 

A Terapia Assistida por Animais é feita por profissionais com objectivos específicos de acordo com a problemática, podendo ser trabalhada com o mais diverso tipo de animais. Mas mesmo em casa é possível observar o efeito que o nosso animal de companhia tem em nós e nos outros. Quando o vamos passear provoca a sociabilização com as outras pessoas, ou quando lhe fazemos uma festa os níveis de ansiedade baixam e sentimo-nos mais relaxados(as), aceita-nos tal como somos, fica sempre contente por nos ver e não julga o que fizemos ou deixamos de fazer. São apenas alguns exemplos.

 

O que é que o seu animal de estimação já fez por si?

publicado às 15:32

Estou de luto... e agora?

por oficinadepsicologia, em 07.09.12

Autora: Ana Crespim

Psicóloga Clínica

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Ana Crespim

Pois é… muitos são os problemas, as pequenas contrariedades do quotidiano, das quais nos queixamos com alguma regularidade. Mas praticamente todas elas acabam por se resolver. Bem ou mal, tudo acaba por seguir o seu rumo. Mas é mais difícil sentir isto perante algo que nos transcende e para a qual não temos forma de resolução: a morte.

 

Muitas vezes é frequente que este tema nunca tenha ocupado muito tempo do nosso espaço mental… Até aquele dia fatídico em que nos bate à porta e leva alguém que fazia parte da nossa vida.

 

Na publicação anterior, expus um pequeno trecho que pretendia retratar os pensamentos e emoções que muitas vezes invadem quem está de luto. Levantei também algumas questões… Será que têm resposta? Várias respostas? Certos e errados? É um tema extremamente delicado. E aqui, como em tudo, as variáveis individuas e o contexto, acabam por deitar por terra algumas teorias ou a possibilidade de dizer “é assim”… Não existe regra. Existe sim a perceção pessoal e a avaliação do clínico. Cada caso é um caso.

 

Então o que pode ser dito? Variáveis individuais? Contexto? Quando falo em variáveis individuais, falo essencialmente de algumas caraterísticas da personalidade de quem está de luto: se tem traços de dependência emocional, se a figura perdida era alguém com quem estabelecia um vínculo desta natureza. Obviamente que não sentimos várias perdas da mesma maneira. A relação que tínhamos, processos de identificação, a história em comum e os hábitos e rotinas que detínhamos com a pessoa que partiu, têm muito a dizer em matéria de luto. Se foi alguém com quem tínhamos uma forte vinculação, laços estreitos, que nos serviu de modelo, com quem nos identificávamos, com quem passamos bons e maus momentos, com a força relacional que isso provoca e que, ainda por cima, fazia parte das nossas rotinas diárias (ex.: telefonema sensivelmente àquela hora do dia; jantar naquele restaurante todas as quintas-feiras; pedir a opinião perante certas decisões; partilhar as pequenas-grandes vitórias de cada dia; entre outros), naturalmente que a dor, o sentimento de vazio e a dificuldade de enfrentar o dia-a-dia serão mais marcados.

 

Em termos de contexto, a existência ou não de uma rede de suporte social, o poder contar com uma figura segura, que nos sirva de suporte para expressar o turbilhão que vai dentro de nós, pode de facto fazer a diferença.     

 

Mas como muito existe para falar sobre este tema, não me vou ficar por este texto. Bem, por mais que tente, nunca ficará tudo dito… Mas eis algumas questões que ainda me proponho a responder:

“O que me espera”? “Como “digerir” isto”? “Devo procurar ajuda”?

Fique atento à minha próxima publicação, em que vou tentar dar resposta a estas e outras questões que se levantam perante o que mais tememos: a morte de alguém querido.

publicado às 09:31

Autora: Marta Gonçalves Porto

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Marta Gonçalves Porto

Hoje gostaria de relembrar a história de Robinson Crusoe. Quem não se recorda da história de um dos grandes heróis da literatura inglesa? Um homem que aquando de uma intensa tempestade, ficou naufragado e sozinho numa ilha que durante algum tempo pensou estar deserta.

Torna-se fundamental, então, reflectir sobre o que permitiu a sobrevivência deste homem, tendo em consideração prévia que apenas poderá ter sido um método digno de um herói.

 

Crusoe ao deparar-se com a sua situação potencialmente trágica e sentindo-se com pouca esperança de um dia vir a ser salvo, decidiu, apesar das circunstâncias, reagir à adversidade. Foi exactamente esta decisão que promoveu a sua sobrevivência.

 

Ao concluir que nenhuma situação poderia ser tão catastrófica que leve um homem a perder definitivamente a esperança, mudou a forma como estava a encarar as suas circunstâncias. Neste sentido, ao não se entregar a um compreensível desespero que colocaria a sua vida em risco, optou por acentuar conscientemente o lado positivo da sua realidade, elegendo uma nova perspectiva.

 

Esta nova perspectiva foi automaticamente acompanhada de uma mudança ao nível das suas cognições, isto é, dos seus pensamentos: “Fui parar a uma ilha solitária” – “Mas ainda estou vivo e não me afoguei, como todos os meus camaradas”; “Fiquei isolado, entre todos os seres humanos fui eu o escolhido para sofrer estas privações” – “Mas também, entre toda a tripulação, fui o escolhido para escapar à morte”; “Nem sequer tenho roupa para me cobrir” – “Mas estou numa região quente, onde quase nunca precisaria de usar roupa, mesmo que a tivesse.”


Neste momento, admito que tudo o que foi supracitado pode ser fácil demais para ser verdade. Não obstante, torna-se fundamental referir que esta mudança ao nível das cognições se encontra na base de uma das Terapias mais eficazes no tratamento das perturbações mentais e do comportamento, ou seja, a Terapia Cognitiva preconizada por Aaron Beck.

 

Por último, gostaria de partilhar o seguinte prisma, influenciado pelo Método de Robinson: Todos nós podemos ser heróis das nossas vidas, alterando a perspectiva da nossa realidade.

publicado às 10:04

Sobre a felicidade

por oficinadepsicologia, em 04.09.12

Autora: Joana Fojo Ferreira

Psicóloga Clínica

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Joana Fojo Ferreira

Para ser absolutamente honesta tenho que partilhar que não sei se sei escrever sobre isto, é tão subjectivo, tão abstracto, e com potencial para seguir tantos caminhos, que me assusto sempre face à perspectiva de ser demasiado reducionista. Decidi contudo arriscar e partilhar uma das várias possibilidades de olhar para isto da felicidade.

 

A primeira questão que me surgiu foi O que é que significa ser feliz?


A primeira resposta foi Não faça a mais pequena ideia. Depois, talvez fruto da frustração, questionei-me Será que é relevante? Será que existe tal coisa? Mas como qualquer uma destas respostas deixava o meu intento de escrever sobre a felicidade cair por terra, a brincar com as palavras da própria questão pensei E se o significado de ser feliz for precisamente viver com significado, com sentido?


Não sei como é que isto vos soa, para mim confesso integrou muito bem tudo o que me apela para felicidade.

Ser feliz é viver com sentido, de forma coerente com o que a cada momento se sente, se precisa. É dar significado às coisas e viver de acordo com o significado que têm para nós.

 

Sorrir quando apetece chorar não faz sentido e não traz felicidade. Só dar quando se precisa também receber pesa, não faz sentido, não traz felicidade. Estar próximo dos outros quando se precisa mesmo é estar só não faz sentido, não traz felicidade…

 

Ser feliz é sorrir, ou mesmo gargalhar, quando dá vontade. Mas é também chorar quando as lágrimas pedem para sair. Ser feliz é dar quando se pode e se deseja. Mas é também receber quando se precisa. Ser feliz é estar próximo quando se precisa de proximidade. E é afastar-se quando se precisa de isolamento. Ser feliz é abrirmo-nos ao mundo quando tanto nós como o mundo estão disponíveis. E é recolhermo-nos em nós próprios quando precisamos de um tempo para nós, de introspecção.

 

Para ser feliz não há uma receita porque a felicidade não é um produto final. Ser feliz é um processo, de simplesmente ser como se é, estar onde se está, como se precisa ser e estar a cada momento, sem nos cobrarmos por isso.

publicado às 12:05



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