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Este consultório da Oficina de Psicologia tem por objectivo apoiá-lo(a) nas suas questões sobre saúde mental, da forma mais directa possível. Coloque-nos as suas dúvidas e questões sobre aquilo que se passa consigo.
Autor: António Norton
Psicólogo Clínico
“ The way to sucess is to keep one’s courage
and patience and to work on
energetically” – Van Gogh
Sobre a ambição começaria mesmo com esta frase, pois essencialmente, concordo com ela.
A ambição, é realmente tornar o nosso eu ideal, real. Nem mais. É sermos autênticos naquilo que acreditamos, que amamos e respeitamos.
Infelizmente não é fácil ser autêntico. Lamento, mas a autenticidade é um caminho de exclusividade que poucos percorrerão porque é muito difícil sermos fortes interiormente e dizer não e dizer sim quando assim tem que ser. E depois surgem mil e uma desculpas que falseiam o nosso ideal e que fazem com que a ele fujamos, lentamente, para nos imiscuirmos no facilitismo e na estereotipização.
Sermos ambiciosos é sermos exigentes com a nossa vida, muito exigentes mesmo e muito sérios, com os nossos sonhos.
Observo as pessoas à minha volta que escolheram um determinado estilo de vida com um emprego estável, razoavelmente remuneradas mas que não são valorizadas pela sua unicidade. E depois? Conformadas com a sua depressão, vão dizendo: - “É a vida!”.
Outros ficam com a pessoa a quem dizem que amam porque não encontram mais ninguém e não querem ficar sozinhas… É compreensível mas indigno. Perderam a ambição… Tudo é mais difícil…
De facto, é curioso observar que à medida que a idade vai avançando a ambição se vai perdendo, assim como se perde o brilho no olhar, ou a vitalidade. Basta olhar à nossa volta. Felizmente há excepções, mas muitas vezes os adultos tornam-se criaturas mais baças...
Quando somos adolescentes somos bonitos, somos jovens, temos o futuro incerto e sentimo-nos livres para poder voar, sonhar e sermos ambiciosos. Quando terminamos a faculdade e conseguimos um emprego fixo, tudo se torna mais difícil… muitas horas de trabalho, cansaço. Sobra pouco tempo e então a nossa vida torna-se rotineira, despida de interesse, de luz, de brilho, de novidade. Não estou a ser pessimista, estou a ser realista. E a verdade é que tal acontece, de facto, muito frequentemente, a pessoas com 27, 28, 29 anos. É incrível mas é verdade! Perderam a ambição… Perderam-na. Entregaram-se ao sistema aglutinador e muitos deixaram de sonhar…
É interessante pensar nestas questões porque não é fácil ser ambicioso quando o nosso círculo social se vai desvanecendo… Os amigos casam-se e deixam de ter tempo para nós; já não há tanta disponibilidade para conhecer pessoas novas. É mesmo assim que acontece. As noites do Bairro Alto tornam-se tristes, baças; estão cheias de caras bonitas que no entanto nos parecem altamente aversivas dada a falta de autenticidade de todo aquele espectáculo social. Sentimo-nos frios e apagados.
Então onde fica a chave da ambição? Onde está a luz? Como a podemos encontrar? Eu acredito que está mesmo dentro de nós e na seriedade do nosso compromisso com a nossa felicidade. É preciso que nos ouçamos interiormente, longe do ruído e dos apelos exteriores. Eu penso que o segredo é esse. É olhar para dentro de mim e perguntar: - afinal o que é que eu quero para a minha vida? Sou feliz? - fazer a pergunta sem medos e ter a coragem de mudar se assim tiver de ser. E quanto ao vazio em que se vive? O que fazer? Sinceramente, se não gostamos do que fazemos devemos ir embora… “Just walk away”.
Nada é mais valioso do que a ligação entre o meu eu ideal, os meus sonhos, o que eu quero ser e aquilo que eu sou. A ambição é isso. É a força da minha vontade, mais alta que qualquer partido, ideia ou juízo. Sou eu no mais fundo de mim a dizer que vivo, que existo e que sou único. A ambição é a concretização da minha unicidade. No fundo, é sermos amigos de nós próprios.
É muito interessante verificar que a psicopatologia, as neuroses, obsessões, depressões, são sinais da falta de autenticidade da nossa vida. As ansiedades, os pesadelos, as insónias, são apenas reflexos do esquecimento da nossa felicidade.
A ambição é o mais importante que existe, porque veicula tudo o resto e é de facto necessário partir para a acção, não basta ficar sentado a pensar, a filosofar e a compor. É preciso ir e sentir a espontaneidade, a irregularidade e o espanto. No fundo isso é que é viver. Ser ambicioso é amar a vida. Amá-la mesmo. Isso é que é ambição. Conhecem alguém mais velho, realmente feliz? Eu tenho dificuldade em encontrar alguém realmente feliz. Chega a uma altura da vida e deixam simplesmente de sonhar e de lutar. Dizem estar cansados. Perderam a ambição.
Teremos que falar connosco toda a nossa vida. Não nos podemos esquecer de nós. É de facto interessante verificar que se não falamos connosco interiormente, surge alguma perturbação que nos indica o esquecimento de nós próprios. O problema é que as pessoas se encharcam de drogas para calar o seu próprio eu, cometendo a maior traição a si próprias.
E o que fazer com o isolamento crescente que a vida vai criando? Simplesmente encontrar novos amigos, saber dizer adeus a alguém, lutar por novos conhecimentos e criar novas amizades. Entrar num clube, organizar passeios, jantares. E assim se fazem novas relações.
Algo fundamental para a ambição é a capacidade de reinterpretação do nosso ser. Perceber que somos diferentes a cada minuto que passa e que não precisamos de ficar presos a uma forma de ser e estar. Acima de tudo, nós criamos! Essa é a nossa força! Podemos mudar os nossos estados interiores as nossas tristezas, as nossas dores, porque criamos. Criamos novos seres dentro de nós mesmos. Fazemos reinterpretações de situações, de pensamentos, de formas de ser e estar. E assim vamos crescendo. Mas o segredo difícil é o equilíbrio entre a contínua renovação e recriação de nós próprios e o compromisso com os nossos sonhos e a nossa ambição.