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Este consultório da Oficina de Psicologia tem por objectivo apoiá-lo(a) nas suas questões sobre saúde mental, da forma mais directa possível. Coloque-nos as suas dúvidas e questões sobre aquilo que se passa consigo.
E-mail recebido
"Olá,
Deambulando e tentanto encontrar alguma resposta para o meu "problema" encontrei o vosso site, mas tenho já consciência que vou precisar de algo mais.
Tenho 34 anos. Elevada auto-estima. Rapariga sem complexos, formada, a trabalhar, casada e sem problemas de saúde.
Sempre tive variações de humor, mais ou menos perceptíveis a terceiros, mas sempre "saudáveis". A típica bi-polar, mais polar do que bi, mas nada que mereça grande reparo.
Aos 23 sofri um grande desgosto com a morte de um namorado num acidente de automóvel, que me fez passar por um luto terrível, na altura com a ajuda de SOCIAN, receitado por psiquiatras.
Entretanto fui mãe e tenho uma filhinha linda de 4 anos. A luz da minha vida.
Tive um pós parto meio complicado a nível profissional, com dissolução de sociedade e que na altura me fez ir abaixo. Não sei se recuperei.
Os pensamentos surgem-me há coisa de 1 ano, 2 no máximo e começaram a ser mesmo insuportáveis, porque não os consigo fazer passar, nem tão pouco livrar-me deles e sinto-me culpada. Têm ocupado a minha cabeça, qual visita chata, que aparece sem ser convidada e provoca estragos imensos.
Antes ocupavem só um bocadinho, e eu achava que era normal, depois começaram a ser bastante presentes, e até os sonhos ocuparam.
Então passo a explicar:
Eu passo o tempo a pensar na morte da minha filha. Já imaginei imensas situações, acidentes, afogamentos, coisas horríveis, o funeral, o velório, como seria se ela não estivesse, enfim todo um horror e uma panóplia de porcarias miseráveis que não entendo a origem nem o porquê de me acontecerem.
Ás tantas começo a achar que são premonições, entro em agonia, não consigo parar de pensar e é uma catadupa de filmes mórbidos... um pesadelo.
Preciso livrar-me disto, vocês poderão ajudar-me a perceber o que se passa comigo?
Obrigada.
V"
Cara V.
Antes de mais, muito obrigado pelo seu contacto. A história que nos conta da sua vida parece ser marcada por acontecimentos muito dolorosos, o que faz sobressair a força que imagino que tenha sido necessária para emergir desses momentos e continuar com a sua vida. Tendo em conta todas as dificuldades que ultrapassou, e a forma como conseguiu sobreviver mantendo a “normalidade” na sua vida, deve ter sido particularmente perturbador e surpreendente dar por si afectada por estes pensamentos. Estes parecem ser pensamentos altamente intrusivos, que a invadem apesar dos seus melhores esforços, e que pelo seu conteúdo se tornam enormemente perturbadores. Imagino que poucas coisas possam afectar tanto uma mãe como ser sistematicamente “bombardeada” por imagens relacionadas com a perda da sua filha. Com o passar do tempo, estes pensamentos parecem ter ganho força até se tornarem um elemento dominante na sua vida psicológica. A forma como começa a temê-los enquanto premonições poderá ser um bom exemplo do poder que estes pensamento adquiriram. Quando andam assim, à solta na nossa cabeça, os pensamentos podem tornar-se autênticos “Adamastores”. Começamos a acreditar neles, a sentir-nos incapazes de os travar, e quando damos por nós estamos lavados em lágrimas ou suor… Na verdade, os pensamentos são apenas isso: pensamentos. Como tal, vão e vêm, e o poder que têm para definir a realidade é aquele que lhes atribuímos. Eu posso pensar que sou uma girafa… Não quererá dizer que o seja! Embora este raciocínio possa parecer evidente, bastante mais complexo é travar o pensamento quando ele surge sob a forma de um tsunami, como parece ser o seu caso. Não me parece possível ter certezas a respeito da natureza destes pensamento, particularmente de um ponto de vista diagnóstico. Tendo em conta o sofrimento que parece experienciar como resultado destes pensamentos, parece-me que poderá ser particularmente importante trabalhar competências de gestão do pensamento, particularmente através de técnicas de meditação e de visualização. Embora exista muita informação, poderá ser importante procurar ajuda especializada junto de um psicoterapeuta. Caso a possamos ajudar de mais alguma forma, por favor não hesite em contactar-nos.
Um abraço,
Francisco de Soure
Oficina de Psicologia