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Este consultório da Oficina de Psicologia tem por objectivo apoiá-lo(a) nas suas questões sobre saúde mental, da forma mais directa possível. Coloque-nos as suas dúvidas e questões sobre aquilo que se passa consigo.
Autora: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
Utilizei o título da canção como título do artigo, pois quero falar de pele.
Aqui, no caso, com um sentido metafórico, representando fronteiras entre Eu e o Mundo (os outros, as situações, as coisas).
Sempre que um assunto é transversal a todas as sessões, sinto-me compelida a escrever sobre ele. Fascina-me que pessoas diferentes, com modos de ser tão únicos, tragam temas tão comuns!
Vou exemplificar algumas situações para depois aprofundar o tema “pele”.
- “estou muito triste porque ele não quer mais falar comigo. Não tenho ânimo para nada”
- “tenho medo que ele me deixe, como fez o meu primeiro namorado”
- “fiquei muito aborrecido com o que ela me disse, pôs-me em causa enquanto profissional”
- “se perder esse emprego (que me faz infeliz), não sei como vou sobreviver”
- “cada vez que a minha mãe começa a querer controlar-me saio do sério”
O que essas frases têm em comum?
Todas essas pessoas estão a sofrer com o impacto de algo ou alguém externo. A atribuição de poder à algo ou alguém está presente em todas as situações.
Na primeira situação, a pessoa perde o seu ânimo, deixa de ter energia para a sua vida e para as suas coisas, porque outra pessoa não quer falar com ela. Aqui, a pele (fronteira) faz falta. Essa pessoa está “embrulhada” com o outro e por isso, o impacto que esse tem na sua vida é enorme. Na sessão, trabalhamos a construção dessa “pele”, que permitiu à pessoa, interpretar a mesma situação da seguinte forma: Ele está num percurso individual, tem o seu timing, os seus recursos, as suas emoções, as suas ferramentas, e está a fazer o melhor que pode dentro desse contexto. Eu estou feliz e tranquila com o que sou e por isso, responsabilizo-me por transformar a minha vida em algo feliz para mim. Assim tenho ânimo para investir em tudo o que me faz bem. O facto dele não querer mais falar comigo não diz nada sobre mim, diz algo sobre o “sítio” onde ele está, e eu respeito isso.
A criação da separação entre os dois, fez com que a minha cliente entendesse que o outro é diferente de si, com um mundo próprio, que nem sempre pode estar em sintonia com o seu. E essa diferença não diz nada de errado ou negativo sobre si.
No segundo exemplo, a cliente embrulhou-se com uma situação e transpõe essa mesma situação para o presente. Não cria pele entre presente, passado e futuro.
Nas sessões fomos capazes de construir a sua fronteira e a interpretação passou a ser a seguinte: o que aconteceu no passado foi o possível, quer para mim, quer para o meu primeiro namorado. A decisão dele sair da relação foi uma decisão dele e por isso, deveu-se ao seu contexto, aos seus recursos, à sua vontade, não diz nada sobre mim. Foi um desencontro entre duas pessoas e não uma rejeição entre uma pessoa forte e uma fraca. Essa situação não está a acontecer agora. O que está a acontecer agora é uma situação única entre duas pessoas únicas, e vou vivê-la e geri-la à medida que ela acontece.
Ela entrou em contacto com o presente, deixando de antecipar negativamente o futuro. Entrou também em contacto com as suas capacidades de gestão de qualquer situação que possa surgir.
Na terceira situação, o cliente chegou a uma sessão muito aborrecido com o que uma pessoa lhe tinha dito. Essa pessoa tinha feito uma observação negativa sobre o seu desempenho. Ele estava zangado e a pôr-se em causa enquanto profissional e mesmo enquanto pessoa. Estava embrulhado!
Ao trabalharmos na sua “pele”, foi possível uma nova interpretação: Estou feliz e tranquilo na minha dimensão profissional, com abertura para melhorar. Não sei o que desencadeou na outra pessoa o desejo de fazer aquela observação, mas sei que essa observação veio dela, é algo que está dentro dela e não de mim. Ao olhar para as coisas dessa forma, seu corpo reagiu de forma positiva, acalmando-se, relaxando e conectando-se com o seu bem-estar e a sessão tornou-se imediatamente mais leve.
No caso do cliente que confunde o seu emprego com a sua sobrevivência, novamente surge o embrulho entre algo interno (sobrevivência), que depende da sua conexão com as suas capacidades, com algo que é externo (o emprego).
Depois do trabalho de construção de uma “pele” mais saudável e forte, a interpretação possível foi a seguinte: eu não sou o meu emprego. Este emprego não me realiza e não me deixa feliz, por isso, não está a contribuir para a minha realização pessoal nem para o meu bem-estar. Estar sem ele será melhor. Terei capacidades de gerir a situação, mesmo que isso implique adaptação a uma nova circunstância prática, ou que passe por uma fase de menor recurso financeiro. Sei que estarei no caminho para a minha realização e isso deixa-me em paz.
Na situação da cliente que está embrulhada com a mãe, ela está extremamente vulnerável em relação à mãe, ficando muito perturbada cada vez que sente que a mãe a quer controlar e/ou criticar.
Ao trabalharmos na sua separação da mãe, ela pôde fazer um exercício de observação do que se passava com a mãe, nas situações em que ela estava a ser mais controladora e mais crítica. Essa observação antes era impossível, pois a cliente estava a sentir-se tão invadida e tão próxima da mãe, que automaticamente transpunha toda aquela energia para si, pondo-se em causa e ficando muito magoada. Ao fazer a observação clara da mãe, pôde ver o seu medo e a sua insegurança. Ou seja, cada vez que a mãe tentava controlá-la ou criticá-la, o que ela estava a sentir era medo e insegurança. Ao visitar a história da mãe, ela entendeu que devido ao seu percurso e recursos, a mãe era uma pessoa muito insegura, sempre com medo de tudo e todos, e transportava quase toda a sua insegurança para a filha. Essa, quando fez a separação através da construção das suas fronteiras, percebeu que aquelas eram questões da mãe e não suas. Ela estava bem, feliz consigo mesma. Pôde inclusive sentir compaixão pela mãe, em vez de raiva.
Criar fronteiras fortes e claras entre nós e o mundo, é indispensável para vivermos bem, felizes, conectados com as nossas capacidades, com respeito e aceitação pelo nosso processo e pelo processo dos outros, pelo nosso timing e pelo timing dos outros. Não sermos invadidos pelo que não é nosso, ficarmos presos em dinâmicas pouco saudáveis que são alimentadas por essa indistinção entre cada uma das pessoas, leva a perturbações emocionais graves, ao insucesso pessoal e profissional, criando até mesmo perturbações somáticas.
O processo terapêutico é sem dúvida um caminho fabuloso no sentido da construção da noção de nós, que permite o processo de construção de uma “pele” saudável.
Lembrem-se de que só podemos ser muito próximos de alguém, ou de algo, se formos separados desse mesmo alguém ou algo. Do contrário, estamos embrulhados nele e não próximos. Esse é mais um dos fantásticos paradoxos que compõem a nossa vida!
Autor: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
A depressão, perturbação comum nos dias de hoje, tem como sintomas a falta de energia, o humor afectado, a falta de interesse e de vontade de fazer tarefas comuns, além de sintomas físicos como dor de cabeça e dor de estômago.
Segundo o médico e ortomolecular Clement Hajian nosso cérebro produz substâncias chamadas de neurotransmissores que controlam inúmeras funções cerebrais. Um destes neurotransmissores, a serotonina, é capaz de dar ao cérebro a sensação de bem-estar, regulando nosso humor e também a sensação de "saciedade".
É sabido que alguns alimentos ajudam o organismo a produzir essas substâncias, aumentando o bom humor e combatendo a depressão. Porém, o médico faz uma ressalva. "Apenas a alimentação não é suficiente para combater um quadro depressivo, sendo necessária uma associação de tratamentos". No entanto, a alimentação é um aliado eficaz no tratamento, não devendo ser subestimada.
Alimentos ricos em magnésio, cálcio, vitamina B6 e ácido fólico melhoram significadamente o humor.
Aqui fica uma lista de alimentos que melhoram o humor e são excelentes aliados no combate à doença:
Castanha-do-pará, Nozes e Amêndoas: Ricas em selênio e ômega 3, eficazes também como antioxidantes. Reduzem o stress e como consequência melhoram o combate a depressão. Recomenda-se a ingestão de duas a três unidades de castanha-do-pará ou cinco unidades de nozes ou dez a doze unidades de amêndoas;
Iogurte e Queijos: Auxiliam na eliminação da tensão e sintomas da depressão, além de ser possível reduzir e controlar o nervosismo e a irritação. O iogurte por ser rico em BCAA, ou amino-ácidos ramificados, fortalece a memória e ajuda para o bom-humor, já queijos sabiamente envelhecidos, são ricos em triptofano e fosfato de cálcio e magnésio devidamente balanceados, mantendo o bom funcionamento eléctrico cerebral;
Frutas: Melancia, abacate, mamão, banana, tangerina e limão são conhecidos como agentes do bom humor. Todas estas frutas são ricas em triptofano, aminoácido que ajuda na produção de serotonina. As frutas agem principalmente na fadiga, no stress e como relaxantes musculares, pela sua composição mineral. Devem ser consumidas diariamente através de três ou cinco porções;
Mel: Esse alimento estimula a produção de serotonina, neurotransmissor responsável pela sensação de prazer e bem-estar. Para usufruir dos benefícios, duas colheres de sobremesa, ao dia, são suficientes, de preferência misturados na água;
Ovos: São uma boa fonte de tiamina e a niacina (vitaminas do complexo B), que colaboram com o bom humor. São ricos em vitamina E e vitaminas do complexo B, como B6, precursora de dopamina, já a metionina e a colina, presentes no ovo, ajudam na produção de outros neurotransmissores. É recomendada uma unidade por dia, no máximo;
Carnes magras e peixes: O triptofano e o ômega 3, presentes nestas fontes de proteína, ajudam na melhoria do humor, pois aumentam a produção de serotonina, que exerce grande influência no estado de humor, é capaz de reduzir a sensação de dor, diminuir o apetite, relaxar, criar a sensação de prazer e bem-estar e até induzir e melhorar o sono. O recomendado é consumir entre uma e duas porções por dia, principalmente de peixes como atum, salmão, ou peixes anchovados que são ricos em fosfato e ômega 3 e tem ação de manter o potencial zeta (potencial elétrico correto), ao nível de sistema nervoso central;
Hidratos de carbono complexos: Ajudam o organismo a absorver triptofano e estimulam a produção do neurotransmissor serotonina, que ajuda a reduzir as sensações de depressão. Uma alimentação pobre em hidratos de carbono, por vários dias, pode levar a alterações de humor e depressão. Alimentos fontes de hidratos: pães integrais, cereais integrais (trigo, arroz). A recomendação é de 6 a 9 porções diárias;
No caso de chocolates a preferência é pelos mais amargos, ou conjugados com fibras, pois devem ser consumidos em pequenas porções e são uma óptima forma de aumentar a serotonina e a dopamina.
Folhas verdes: Estudos mostram que uma alimentação com consumo elevado de folato (importante vitamina do complexo B) está associada a menor prevalência de sintomas depressivos. Um dos alimentos ricos em folato são as hortaliças folhosas verde-escuras (espinafre, brócolis, alface). Além disso, a alface quando fervida pode fornecer fito-hormônios, mesmo na forma de chá que ajudam a combater o mau-humor;
Bom apetite!
Aproveitamos para lembrar que o grupo terapêutico de tratamento de depressão tem início no dia 23 de Janeiro, tendo inscrições reduzidas e um custo igualmente mais reduzido por comparação com a intervenção individual. Inscreva-se já enviando um email para contacto@oficinadepsicologia.com
Autora: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
www.oficinadepsicologia.com
De acordo com o professor de Psicologia Organizacional e Saúde da Universidade de Lancaster, Cary Cooper, o
uso excessivo de smartphones pode levar à depressão, estresse e insônia, . Segundo Cooper, os aparelhos oferecem uma saída passiva onde o usuário não precisa interagir com o mundo ou enfrentar os problemas.
Assim como a luz da televisão atrai e entorpece os sentidos, os aparelhos também, segundo o psicólogo que falou para o jornal The Sun; podem causar vício e destruição. "As tecnologias de computador podem ser viciantes, porque elas são psicoativas - alteram o humor e, muitas vezes desencadeam sentimentos agradáveis", explicou Cooper.
Veja a seguir dicas do professor Cooper para limitar o tempo de uso e evitar problemas de saúde:
Saiba o momento de usar:
O telefone está sempre lá, mas isso não significa que deve usá-lo o tempo todo. Existem momentos em que precisa concentrar-se em outras coisas; como na condução.
Fale mais:
Use o telefone para organizar conversas pessoalmente. Estar fisicamente com alguém melhora a qualidade da comunicação. A linguagem corporal ajuda na transmissão das mensagens.
Exercite-se mais:
A menos que a sua profissão exija que esteja sempre contactável, fique algumas horas longe do telefone. Exercícios aeróbicos, como a corrida, aumentam o fluxo de sangue e oxigênio para o cérebro, que regenera os receptores e ajudam a raciocinar melhor.
Faça um balanço:
Da mesma forma que um fumador não consegue ficar sem os seus cigarros, uma pessoa viciada na tecnologia dos smartphones tem dificuldade em ficar sem seu telefone. Estipule horários do dia para o uso do telefone e evite fazer pequenos acessos fora destes períodos.
Use-o melhor:
Não há nada de errado com os smartphones, o problema é como a pessoa o usa. Como qualquer ferramenta, o telefone precisa ser usado com sabedoria.
Peça Ajuda:
Não está sozinho e não é vergonha pedir ajuda ao identificar que tem um problema.
Autora: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
Todos os dias ouço a palavra Crise e sempre com uma conotação negativa. Surge constantemente na comunicação social, ou no contexto das sessões com os clientes, ou através de e-mails, em conversas com os amigos, na rua, no café, no supermercado, enfim, em todo lado!
Reparei também, que apesar de todas as pessoas comentarem que não aguentam mais falar e ouvir sobre crise, continuam a repetir o que sentem em relação a ela: “estou com medo do futuro”, “as coisas vão mudar para pior e não sei como vou fazer”, “agora é que vai ser, vou ter que cortar em várias coisas”, “estou muito inseguro”, “não sei como vou manter a casa”, “não sei como vou pagar o carro” etc, etc etc.
Há algo recorrente em todas as conversas que ouço: o sentimento de insegurança perante situações futuras que ainda não estão a acontecer, a associação entre bem- estar e bens materiais e, naturalmente, a resistência à mudança. E todas essas visões ou atitudes impedem essas mesmas pessoas de gerir a crise e saírem dela mais fortes.
Porque faço a distinção entre vencer e gerir a crise? Lemos ou ouvimos diariamente o termo “vencer” a crise, e neste termo está implícita uma noção de conflito, de guerra contra um inimigo que devemos vencer, gerando desde já uma atitude negativa de tensão. A questão é que olhar para a crise dessa forma redutora, no limite, não nos ajuda a entendê-la, a geri-la e a transformá-la em algo que pode nos ser favorável.
Autora: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
Falamos constantemente em pessoas perturbadas, em patologias, mas raramente falamos sobre pessoas saudáveis e sobre o que é ser saudável.
A verdade é que muitas das pessoas que nos procuram têm expectativas irrealistas sobre o que é ser saudável. Muitas vezes atribuem o ser saudável a condições externas, como o sucesso, o casamento e por aí em diante. Muitas dessas pessoas até são saudáveis em determinadas dimensões, mas têm um olhar redutor e limitado sobre as suas capacidades e potencial.
Então o que é ser saudável?
A Organização Mundial se Saúde define saúde como “ um estado completo físico, mental e social de bem- estar, e não apenas a mera ausência de doença”. Eu acrescentaria ainda a noção de movimento e de integração ao meio, ou seja, saúde será a manutenção deste estado completo de bem-estar num continuum de equilíbrio e de direcção no meio em que o indivíduo está inserido.
Para olharmos para o que é ser saudável, temos antes que olhar para o que é o ser humano.
Os autores da Gestalt Terapia definem o ser humano de uma forma que considero brilhante: “o ser humano é um conglomerado de forças polares que se entrecruzam.” (Zinker. J. 2007). Por exemplo, uma pessoa que tem como característica a doçura, também tem a sua polaridade, a dureza.
Uma característica não tem necessariamente só uma polaridade, tem várias, por exemplo, a crueldade pode não ser a única polaridade da delicadeza, a insensibilidade e a frieza perante os sentimentos dos outros, também pode ser uma polaridade da delicadeza.
Autora: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
“Sei que foi culpa minha, não lhe dei atenção estes anos todos, é natural que ela tenha se apaixonado por outra pessoa”;
“O meu pai está sempre zangado, todos os dias, a culpa é minha pois sou uma fonte de preocupações”;
“Ele disse que precisava de outras experiências, que estava numa fase pouco disponível, isso parece-me mentira, sei que a culpa é minha, já não é a primeira vez que alguém me deixa”;
“Ele diz que sou uma má mãe, acho que tem razão, a culpa é minha do meu filho fazer tantas birras”;
“As agressões são constantes, a culpa é minha de o deixar tão zangado”;
“Se eu estivesse lá o acidente não teria acontecido, a culpa é minha!”
Estas frases parecem-lhe familiares? Para mim sim, pois são referidas diariamente no consultório por pessoas que assumem a culpa de tudo na sua vida.
Há pelo menos duas impressões imediatas que saltam à vista nestes exemplos. Uma implícita: a presença única do EU. Repararam que tudo passa a ser sobre a própria pessoa quando ela se assume culpada de algo?
Eu, eu, eu, como se elas tivessem todo o poder de controlar tudo e todos e fosse tudo sempre sobre si, o outro praticamente não existe na relação, nada é sobre o percurso do outro, tudo vem parar sempre na noção de que aquilo que aconteceu se deve antes de mais a alguma característica ou acção da própria pessoa. A questão é que elas não se sentem grandes e nem percebem que este mecanismo tem muito de omnipotência. Continuam a sentir-se as pessoas mais pequenas do mundo. Oscilam entre a própria culpa ou então são vítimas e a culpa é do outro, mas em qualquer um dos casos sentem-se sempre fracos e sem poder de mudar a situação.
A segunda impressão, esta mais óbvia, é mesmo a noção de culpa. É sobre esta noção que hoje decidi “viajar” um pouco, pois noto a sua capacidade limitadora e estagnante. Observo diariamente que pessoas “culpadas” não fazem uma interpretação de si mesmas, dos outros e das situações de uma forma saudável.
Quando exploro com estes clientes o que é da sua responsabilidade e o que é dos outros, sentem-se muito desconfortáveis e utilizam a palavra CULPA. Muitas vezes acreditam que culpa e responsabilidade são sinónimos, mas na verdade não são!
Na culpa o que surge é essencialmente um sentimento depreciativo de si mesmo que deriva de uma crítica acusatória, já a responsabilidade é uma habilidade, uma capacidade de responder e agir perante algo. Com ela, surge a noção de liberdade e força para lidar com circunstâncias que criamos ou ajudamos a criar. A culpa nos tira força e nos deixa numa posição de vítima de nós mesmos. Ela pede punição e dor, mas não oferece criatividade para reparar o que ficou mal resolvido.
Muitos autores sugerem que o conceito de culpa como um sentimento auto punitivo surge com a Bíblia. Sabemos que segundo o livro sagrado, Deus criou o Homem à sua imagem e semelhança mas não lhe concedeu o discernimento do bem e do mal, capacidade que só Deus possuía.
No entanto, o homem ambicionando ser igual a Deus, conhecedor do bem e do mal, desobedeceu ao seu criador comendo do fruto que lhe tinha sido proibido. Após comerem do fruto proibido o homem e a mulher tomam consciência da sua condição imperfeita e do sentimento de culpa pelo seu acto. É portanto, deste episódio que nasce a culpa e a necessidade de um castigo como forma de expiação da mesma culpa.
A palavra Culpa vem do Latim culpa e designa não só uma falta para com a lei, seja ela religiosa ou civil, mas também a consciência dessa falta por quem a cometeu. Assim, o conceito de culpa serve há anos para punirmos quem transgride leis e normas, serve para a organização da sociedade. Está presente no âmbito jurídico e penal, no âmbito social e surge sempre que alguém se desvia da norma.
No entanto, quando saímos da dimensão social e passamos para a dimensão individual, a culpa torna-se redutora, estagnante, na medida em que retira liberdade e força da pessoa para resolver a situação. Leva a sentimentos de auto-punição que cada vez mais danificam a auto-estima, impossibilitando uma vida feliz e saudável.
Juntamente com a noção de culpa, aparece a noção de que não se pode errar. No entanto, sabemos que a aprendizagem, a evolução, vem do erro e da lição que aprendemos com este erro. A culpa impede uma interpretação construtiva do erro, impossibilitando o desenvolvimento.
A culpa é o sentimento de não ser digno, de ser mau e traz remorso e censura. É um movimento de raiva virado contra o próprio que muitas vezes só diminui com a punição. Por vezes, a punição nunca é suficiente para reduzir a sensação de culpa e a pessoa vive num ciclo constante de depreciação própria.
Características comuns em quem sente culpa:
- Preocupação excessiva com a opinião dos outros;
- Desconforto quando recebe prendas ou elogios. Não se consideram dignos;
- Raiva reprimida;
- Dificuldade em assumir responsabilidade pelos próprios actos;
- Sentimento de rejeição e vitimização, não se sentem suficientemente fortes;
- Atreitos à doenças, ou acidentes frequentes
- Dificuldade em expressar os reais sentimentos e em dizer não;
- Necessidade em agradar;
- Agem para os outros e não para si mesmos
Consequências da culpa:
- Auto-punição;
- Medo;
- Sofrimento;
- Remorso;
- Estagnação;
- Doença;
- Tristeza/depressão;
- Submissão;
- Prisão emocional;
- Solidão;
- Dificuldade em impor limites, dizer não;
- Fuga através do álcool, drogas;
- Compulsão alimentar;
- Conflitos internos e nas relações ;
- Dificuldade em sentir prazer;
- Destruição da auto-estima e amor-próprio
Então o que fazer se identificarmos em nós mesmos esta tendência?
Em primeiro lugar entender que culpa é diferente de responsabilidade. A culpa pressupõe um vilão e uma vítima, a responsabilidade é partilhada entre dois iguais. Assim, nos relacionamentos, há sempre responsabilidades dos dois lados, observe qual é a sua e lembre-se de entender qual é do outro.
Lembre-se que nem tudo é sobre si. Você não tem poder sobre a decisão dos outros, elas devem-se ao processo do outro e não ao seu, não tem poder de impedir catástrofes, doenças e acidentes, tem apenas poder de decidir sobre a sua própria vida e buscar caminhos para a sua felicidade. Com certeza eles não passam por continuar a sentir-se culpado de tudo!
Responsabilidade é força, é liberdade para modificar o que não está bem, com o foco no futuro. É assumir e aprender com as consequências dos nossos erros e olhar para eles como oportunidades de aprendizagem. É uma postura adulta e saudável perante a vida.
O processo terapêutico é entre outras coisas, o processo que permite a consciência da responsabilidade. Permite a mudança de um padrão de culpa para outro mais consciente, saudável e livre. Está a espera de quê para começar?
Autora: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
Numa das formações em que participei, um dos professores (que tive a sorte de ter), disse: olha para os teus clientes como se eles fossem um mundo e tu fosses um explorador!
Esta postura quase ingénua, sem ideias pré concebidas, sem expectativas, em Psicoterapia Existencial é chamada de Epoché. Este é um termo grego que significa suspensão de juízo, ou uma atitude que não nega nem aceita uma proposição ou juízo. É uma das fantásticas ferramentas de um terapeuta existencial.
Olhar para o cliente com esta “espécie” de ingenuidade, com total abertura, aceitação, curiosidade e interesse, sem ideias pré concebidas, permite-me realmente ver o cliente sem colocar-me a mim (e ao meu mundo) à sua frente. Sempre que recebo alguém no consultório sinto uma vontade enorme de “mergulhar” no mundo daquela pessoa, conhecer todas as suas dimensões, saber como é a experiência daquela pessoa em cada situação. Esta postura permite ao outro não se sentir julgado e ajuda a que perceba que na maioria das vezes quem não se aceita é ele mesmo em primeiro lugar.
É fácil ser Indiana Jones? Não! Todos nos habituamos a existir num sistema de valores, de julgamentos, de rótulos. Suspender tudo isso exige consciência e novos hábitos.
Dei por mim a perceber que esta postura é altamente útil não só no consultório, mas em toda a minha vida. Nas minhas relações, no mundo, olhar para tudo com abertura, aceitação, curiosidade e interesse genuínos, ajuda-me diariamente a ser surpreendida, a não esperar dos outros aquilo que eu mesma faria, a não ficar magoada com alguém só porque esse alguém é diferente de mim.
Autora: Fabiana Andrade
Psicóloga Clínica
Joseph Zinker escreveu “Há um momento para tudo e um tempo para todo propósito abaixo do céu. Tempo de nascer e tempo de morrer. Tempo de plantar e tempo de arrancar a planta. Tempo de matar e tempo de curar. Tempo de destruir e tempo de construir. Tempo de chorar e tempo de rir. Tempo de gemer e tempo de bailar. Tempo de atirar pedras e tempo de recolher pedras. Tempo de abraçar e tempo de separar. Tempo de buscar e tempo de perder. Tempo de guardar e tempo de deitar fora. Tempo de rasgar e tempo de costurar. Tempo de calar e tempo de falar. Tempo de amar e tempo de odiar. Tempo de guerra e tempo de paz.”
Ele refere-se à variedade de ritmos que existem na vida e cuja falta de consciência e/ou aceitação nos dificultam a tarefa de sermos felizes.
Não são raras as situações em que meus clientes referem sensações de estagnação, de estarem presos, bloqueados, da sua vida não andar para frente. Quando exploro com eles o assunto, muitas vezes deparo-me com uma não-aceitação dos diferentes ritmos da vida e dos paradoxos inerentes a estes mesmos ritmos:
- não entendo como ele pode magoar-me se me ama
- tenho medo de morrer
- quero estar próxima mas sinto que me anulo na relação
- sinto um vazio quando não estou com ninguém