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Conjugalidades - Parte 2

por oficinadepsicologia, em 13.08.12

Autora: Inês Franco Alexandre

Psicóloga Clínica

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Inês Franco Alexandre

Em terapia de casal, as crenças de cada um dos elementos sobre a relação tornam-se visíveis,  através do conteúdo do que me dizem – como quando explicitam o que desejam da relação ou o que acreditam serem os factores de (in)satisfação – e também através da forma que a relação assume, mesmo em sessão – se há um dos elementos que fala mais, se os dois têm igual espaço, se existem lutas ou competição na tomada da palavra . Através da observação destas dinâmicas vamos entendendo quando um dos elementos está, naquele momento, mais centrado na relação – no nós – e menos em si (quando, por exemplo, propõe passar mais tempo em casal ou lhe é imprescindível ter projectos a dois) enquanto o outro elemento está mais focado nos espaços de diferenciação (quando propõe mais tempo individual, fala mais sobre si e das coisas de que gosta, fala mais sobre o outro enquanto indivíduo separado de si, apreciando-lhe a individualidade). Este tipo de dinâmicas, resultante de uma diferença na perspectiva que cada um adopta sobre a relação entre o eu o tu e o “nós” (ver parte I), pode facilmente causar conflito. Quando sinto que o outro não age de acordo com o mesmo modelo que eu, surgem muitas vezes medos e inseguranças – se não está tão centrado em “nós” é porque já não gosta de mim, porque esta relação não lhe faz sentido, porque não retira prazer do tempo comum, porque não lhe basto – medos estes que também estão, na maior parte das vezes, relacionados com a nossa história individual.

 

Alguns casais dizem-me, com alguma surpresa, que a relação entre eles é diferente na sala de terapia do que quando estão sozinhos, ainda que discutindo os mesmos assuntos. Falam-me da importância de um árbitro, que tem como função a mediação entre eles. Talvez tenham razão, porque julgo que um dos factores de sucesso da terapia seja a maior consciência dos casais de que podem e sabem fazer diferente, e que o poderão fazer também sem a presença de um terceiro elemento. No entanto, não me coloco no papel de um árbitro, porque não considero que seja minha função a de impor regras e faltas. Perguntei-me então várias vezes o que faria com que os casais conseguissem discutir, na minha presença, de uma forma que lhes trouxesse menos sofrimento. Julgo que uma das razões será o facto de, apesar de não ser neutra relativamente aos temas que me trazem (desengane-se quem imaginar que a neutralidade é uma possibilidade para algum ser humano, ainda que terapeuta), permanecer sempre disponível para conhecê-los, individualmente. Ou seja, tendo a adoptar uma postura de curiosidade e compreensão em relação a estas três entidades – os dois “eus” e o “nós” – dando espaço a cada um deles e tendo em atenção os modelos relacionais que cada um dos elementos terá como base, quais as suas crenças, o que acreditam dar-lhes significado à vida e à relação. Isto permitirá que os casais redescubram que diferentes perspectivas não implicam que o outro não nos valida ou não gosta de nós, mas simplesmente que isso resulta de uma forma diferente de olharem para si e para a relação naquele momento das suas vidas, o que por sua vez depende em grande medida da história individual de cada um. E, claro, poderão também descobrir que o modelo do outro não se coaduna com as suas necessidades e crenças fundamentais sobre o que querem para si e para a relação.

 

A minha presença parece então permitir que cada um dos elementos entenda que é possível que as duas perspectivas coexistam, porque eu mesma entendo que as duas podem coexistir, sem que uma invalide a outra. Para isso, tento manter uma postura de abertura e curiosidade, dando-me espaço para ouvir e compreender cada uma das pessoas. Tento por um lado colocar-me no lugar do outro, e por outro lado entender como é que a perspectiva de cada uma das pessoas me faz sentir, enquanto indivíduo. Este exercício dá-me alguma flexibilidade que me permite compreender as duas perspectivas. Por último, tento colocar mais questões e fazer menos afirmações.

 

Para os casais torna-se difícil, é claro, fazer este tipo de exercício, sobretudo em alturas de conflito, quando os medos e as inseguranças emergem. Ao longo do tempo fui também entendendo que, para haver este movimento de abertura e compreensão de parte a parte, que implica descentrarmo-nos e entendermos que as nossas reacções imediatas são grande parte das vezes causadas por inseguranças nossas, seria importante ter sempre presente o amor que temos pelo outro e que ele tem por nós. Por mais banal que pareça, este é o grande reservatório de energia para lidar com o conflito e que permite aos casais não colocar uma grossa armadura quando discutem. Para que esse amor esteja presente, torna-se imprescindível promover o conhecimento mútuo, estimulando a curiosidade sobre a pessoa que temos ao lado, perguntando-lhe sobre si, sobre os momentos mais importantes da sua vida, os seus sonhos, projectos, ambições, princípios de vida. Não menos essencial, será lembrarmo-nos do que nos apaixonou no outro, nos momentos bonitos da nossa história comum. Centramo-nos com frequência no que corre menos bem na nossa relação, e esquecemo-nos de relembrar e de manter o que gostamos tanto nela. E por último, não posso deixar de mencionar a necessidade de nos focarmos nos detalhes – nos bilhetes, nas mensagens, nos abraços inesperados, nos sorrisos, nas surpresas. O essencial pode estar contido num detalhe.

publicado às 10:15

Conjugalidades - Parte 1

por oficinadepsicologia, em 12.08.12

Autora: Inês Franco Alexandre

Psicóloga Clínica

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Inês Franco Alexandre

Num casal, existem três elementos: o eu, o tu e o nós (Caillé, 1991). Existem duas pessoas, cada uma com a sua história de vida, os seus sonhos e projectos, as suas alegrias e os seus fracassos, os seus medos e fantasmas, a sua forma própria de olhar para o mundo, e uma entidade relacional, também com uma história e uma identidade própria. Em consonância com esta ideia, existirá então um espaço próprio para estas três entidades: um espaço de diferenciação de cada uma das pessoas – do eu e do tu - e um espaço de comunhão – do nós – que resulta da intersecção dos outros dois.

 

A conjugação destes três elementos e dos respectivos espaços nem sempre é fácil. Num casal existem, por vezes, perspectivas diferentes entre as duas pessoas sobre os espaços que a diferenciação e a comunhão devem ocupar. Isto acontece, por exemplo, quando uma das pessoas julga que o nós deverá ocupar muito espaço e exigir naturalmente disponibilidade e energia de cada um, e a outra pessoa imagina que deve existir mais espaço individual e menos de casal. Nestes casos, existe uma dificuldade na conjugação das duas perspectivas sobre o casal. É a diferença de perspectivas, e não o facto de haver uma mais válida do que a outra, que cria o conflito.

 

As perspectivas ou modelos que criamos sobre as relações dependem de muitos factores: da sociedade em que estamos inseridos, que dita quais as regras de funcionamento numa relação (um relacionamento com sucesso no mundo ocidental e no mundo oriental terá, com alguma certeza, contornos diferentes); dos modelos que tomamos como referência de sucesso - pais, avós, familiares, amigos – que nos levam a tender a perspectivar as relações da mesma forma; dos modelos que tomamos como referência de insucesso - pais, avós, familiares, amigos - e que nos fazem ter medo de repetir outras histórias e nos levam a comportar-nos de forma inversa.

 

Estes modelos de relação são muitas vezes inconscientes, e consistem em crenças que vamos construindo sobre como devem ser as relações para que tenham sucesso, funcionando como um guião de actuação. Como este guião é, na maior parte das vezes, inconsciente, o que sentimos, os comportamentos que adoptamos e a forma como reagimos aos comportamentos do outro também são, muitas vezes, automáticos. Ou seja, não temos consciência de que sentimos e agimos com base nesses modelos. Mais ainda, temos tendência a confirmar os nossos modelos, através do mecanismo de atenção selectiva, o que quer dizer que nos focamos nos sinais, internos e externos, que nos dizem que o nosso modelo está certo. E porquê?

 

Todos nós precisamos de crenças sobre as quais assentamos o nosso comportamento. Por exemplo, acreditamos que num mundo justo não devemos roubar, o que faz com que não roubemos. Estas crenças são-nos essenciais, porque são elas que nos permitem explicarmos, a nós e aos outros, o nosso comportamento, uma necessidade presente em todos os seres humanos e que parece estar relacionada com a questão da confiança: confiamos mais em quem sabe explicar melhor o seu comportamento, porque poderemos prever com maior confiança qual o comportamento que irá adoptar em circunstâncias semelhantes.

 

Do mesmo modo, acreditamos que para sermos felizes num relacionamento deve haver respeito, simpatia, amor, paixão, cordialidade, que devemos reservar mais ou menos tempo para o casal, mais ou menos tempo para cada uma das pessoas, devemos dar-nos com amigos ou não, sermos mais ou menos fechados, etc. E, uma crença que creio fundamental, acreditamos que é mais ou menos fácil conjugarmos quem somos, a nossa individualidade, com a criação do nós.

 

Construímos então teorias: sobre nós, sobre o outro e sobre as relações. Tendo como base algumas crenças, tendemos a comportar-nos de acordo com estas, e tendemos também a confirmá-las e reconfirmá-las. Por exemplo, se acredito que o outro gosta de mim, tenderei a procurar sinais que mo confirmem – o meu companheiro diz-me muitas vezes que gosta de mim, está alegre quando está comigo, envia-me mensagens carinhosas a meio do dia – e a desvalorizar sinais do contrário – não agiu como de costume, anda mal disposto há muito tempo, não faz o que lhe peço o que quer dizer que não me ouve.

 

Sendo incontornável termos crenças, não é incontornável que elas se mantenham as mesmas a vida inteira, e sobretudo que não as possamos flexibilizar. Ao longo do tempo os nossos modelos de actuação tornam-se rígidos, como se fossemos engrossando as paredes da nossa sala e se tornasse cada vez mais difícil comunicar entre compartimentos.

 

Num casal, os modelos individuais podem funcionar em determinado momento da vida, sendo fácil a conjugação de perspectivas, e não funcionar noutras, sendo necessária alguma mudança ou flexibilização. As diferentes etapas do ciclo de vida do casal, o crescimento individual, os acontecimentos por que vão passando, são elementos que vão obrigando, naturalmente, cada uma das pessoas a rever os seus modelos e o casal a mudar o seu funcionamento. Por exemplo, é provável que a conjugação dos espaços individuais numa fase inicial de paixão não seja semelhante à que acontece quando nasce um filho. Como conjugar, então, a influência de tudo isto na forma como cada uma das pessoas se vai construindo e reconstruindo, na forma como olha para o mundo e para a relação, mantendo um relacionamento satisfatório?

 

Nestes momentos de alguma crise, torna-se essencial transformá-la numa oportunidade de crescimento a dois. Muitos dos casais que acompanho em terapia e que ultrapassam períodos mais difíceis relatam como muito importante a sensação do esforço ter valido a pena, no sentido de fortalecimento da relação. Na parte II deste texto abordarei alguns dos aspectos que considero relevantes na gestão conjugal destes períodos.

publicado às 13:52

Relações de consumo imediato?

por oficinadepsicologia, em 31.07.12

Autora: Inês Alexandre

Psicóloga Clínica

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Inês Alexandre

O despertador toca. Aguardamos 10 minutos antes que o dia comece. Tenho de levantar-me e correr para o trabalho e correr para o almoço e correr de novo para o trabalho e correr para ir buscar os filhos ou ir para o ginásio ou ir arranjar o telemóvel que se estragou ou ir comprar umas calças e também tenho de trocar aquela televisão que é pequena demais e o computador que não é tão rápido quanto eu gostaria.

Vivemos assim, a mil à hora, à procura de algo que nem sabemos o que é. Consumimos produtos que nos entram em casa também a mil à hora e descartamo-los porque já não nos servem, por uma qualquer razão que inventamos também com facilidade. O consumo é imediato e centrado no prazer e na necessidade, tão presente neste tempo em que vivemos, de ter. Até as palavras que utilizamos são denunciadoras: não tenho dinheiro, não tenho tempo, não tenho saúde, não tenho amor, não tenho boas notas. Parecemos viver, de uma forma geral, centrados no consumo: temos de ter aquele carro, aquela casa, aquele boneco, aquela roupa, aquele electrodoméstico, aquela marca. O que temos define-nos, é um espelho do que somos.

 

E para termos, há que… produzir. Corremos para o trabalho para produzir e sermos eficazes (outra palavra cara), realizando um máximo de coisas num mínimo de tempo possível. Para que sejamos considerados e tenhamos dinheiro para poder ter, consumir rápido com o que ganhámos a produzir rápido.

 

Educamo-nos e aos nossos filhos assim, com os verbos ter e fazer, sem que exista grande espaço de reflexão. Lembro-me muitas vezes dos meus tempos de escola e das aulas serem orientadas quase exclusivamente para uma coisa: para podermos fazer testes e ter boas notas e entrar para a faculdade. Para aqui fazermos exames e termos boas notas para virmos a ter um bom trabalho. Para produzirmos muito e termos bastante para podermos dar aos nossos filhos uma boa educação. E o ciclo repete-se.

Os tempos de crise, dolorosos para quase todos, têm-nos trazido algo: a consciência da insustentabilidade deste modelo, não só em termos macros sociais, mas também aos níveis individual e familiar. Afinal, se nos centramos e definimos, enquanto pessoas e enquanto grupo, no capital que produzimos, o que resta de nós sem dinheiro? Quem sou eu sem as coisas que compro? O que faço com o meu tempo, no dia em que não ande a correr para produzir para a seguir consumir? O que faço comigo?

 

Estas são problemáticas cada vez mais presentes em consultório, nomeadamente nas consultas de terapia conjugal ou familiar. Os sistemas conjugal e familiar constituem espaços privilegiados de transformação e têm sofrido mudanças profundas. Numa sociedade virada, de uma forma geral, para o prazer e consumo imediato, a noção de esforço (e, por consequência, a de mudança) não é, muitas vezes, vista com bons olhos. Também na conjugalidade a correria é desenfreada para que possamos” ter”, “agora” e de um modo que nos satisfaça. As relações devem ser fáceis, fluidas, sem grandes dificuldades, devem preencher-nos e se possível não nos colocar em causa, pois isso envolveria o esforço de nos mudarmos.

 

As relações não têm de ser difíceis ou trazer sofrimento, assim como não tem de trazer sofrimento a frustração de não conseguir ter aquele automóvel que tanto desejamos. Uma relação pode ser fácil, se por fácil não entendamos sem conflito, sem dificuldades, sem ajustes, sem mudança, sem esforço. A capacidade de mudar mantendo o que nos é essencial é, no meu entendimento, uma das grandes chaves da felicidade a dois. Como nos diz Erich Fromm, “o amor é uma arte […] se queremos aprender a amar temos de fazer o que faríamos se quiséssemos aprender qualquer outra arte, como a música, a pintura, a carpintaria”. Só com esforço poderemos construir-nos, individual e colectivamente.

 

Talvez as soluções passem por conceder-nos outros espaços: espaços para sermos. Aqui, a terapia surge apenas como uma das possibilidades. Temos as escolas, os grupos de amigos, o tempo em casal e em família, os espaços individuais. Espaços de reflexão que nos permitam irmos descobrindo quem somos, individual e colectivamente, para que não fiquemos dependentes do que temos mas de quem somos. Espaços de partilha – no casal, na família, com os amigos, na sociedade – que satisfaçam a nossa necessidade profunda de pertença a algo maior. Espaços de auto-conhecimento, porque são estes que nos permitem compreendermo-nos, amarmo-nos e construir uma relação sólida connosco, condição fundamental para que possamos dar e amar os outros, e com eles construir relações profundas e de verdadeira intimidade.

publicado às 13:11

Porque entretanto há esta outra vida para levar

por oficinadepsicologia, em 25.06.12

Autora: Inês Franco Alexandre

Psicóloga Clínica

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Inês Franco Alexandre

Nos processos psicoterapêuticos em que participo, individuais ou de casal, não é raro colocar as seguintes questões:

- Como era quando era criança?

- Quais eram os seus sonhos?

Faço-o com genuína curiosidade, tentando descobrir quem são as pessoas à minha frente: de que gostam, o que as realiza, o que é que as faz sentir-se vivas.

Não é raro, também, ouvir a seguinte resposta:

- Foi há muito tempo, não me lembro.

 

E a vida vai andando andando e nós esquecendo-nos. Colocamos em recônditas memórias o que queremos, o que desejamos, o que amamos – quem somos – relegando-o para segundo plano (amanhã penso nisso), como se amanhã fosse uma segunda vida. Fazemo-lo, todos (em maior ou menor medida). Porque entretanto hoje há essa (outra) vida para levar.

Num mundo em transformação como o de hoje, a insegurança é geral. A geração adulta actual cresceu a acreditar que o mundo era previsível e que a felicidade era garantida para quem tivesse certo número de anos de estudo, casa comprada a crédito e uma família “funcional”. O que não previmos foi que nestes últimos vinte anos o mundo mudasse desta forma. O trabalho não é garantido e afinal a felicidade não se compra a crédito. Salva-se a família “funcional”. Salva-se?

E a vida vai andando andando e nós esquecendo-nos. De que gostamos tanto de conversar, de escrever, de pintar, de ler, de cinema, de trabalhar, de estudar, de ouvir música, de ir à praia – quem somos. Porque entretanto hoje há essa (outra) vida para levar.

- Se nada é certo, para quê sonhar? Eu não arrisco!

 

A falta de sonho individual resultante de uma insegurança básica faz-nos, muitas vezes, colocar todas as expectativas nas relações amorosas, que se mantêm assim profundamente idealizadas. O meu companheiro passa a ser a minha fonte de realização e, como tal, terá de desempenhar na perfeição vários papéis: tem de ser o melhor amigo, o melhor amante, tem de adivinhar os nossos desejos, saber comunicar, ser seguro, ser sensível, ser divertido, ser profundo, ser leve, ser inteligente, etc, etc. O confronto com a realidade que é o outro é por vezes insuportável e pode originar dois tipos extremos de comportamento: a fuga para trás, ou o evitamento da relação, evitando assim também a perda do outro idealizado; a fuga para a frente, ou a luta desenfreada para que o outro mude no sentido que desejamos. A maior parte dos casais que chega à terapia adopta o último comportamento, insistindo, cada um dos elementos, na mudança do outro.

 

Quando insisto na necessidade de cada um se centrar em si mesmo, sou muitas vezes mal entendida

- Não quero ser egoísta!

dizem-me. Não entendendo que, pelo contrário, sermos quem somos em liberdade (respeitando, é claro, os limites do outro) é um duplo acto de amor: connosco, e com o outro, porque libertador também de um peso e de uma expectativa que muitas vezes não nos permite, verdadeiramente, amar o nosso companheiro. Em terapia de casal três processos ocorrem em simultâneo: o processo de mudança na relação, e o processo de mudança de cada um dos indivíduos. E é no momento em que cada um se responsabiliza pelo seu processo que tudo começa a acontecer.

 

E a vida vai andando, andando e nós lembramo-nos. Do que nos preenche, do que gostamos, do que é imprescindível fazermos acontecer para que nos sintamos vivos – quem somos. Porque entretanto hoje há esta (a nossa) vida para levar.

publicado às 08:52

Desejo OU segurança? Desejo E segurança!

por oficinadepsicologia, em 19.05.12

Autora: Inês Franco Alexandre

Psicóloga Clínica

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Inês Franco Alexandre

Muitos dos pedidos em terapia de casal, mesmo que não sejam revelados desta forma no início da terapia, estão relacionados com dificuldades na intimidade, sendo a perda ou diminuição do desejo de um dos parceiros uma das queixas mais frequentes.

 

Existe a crença social que a paixão inicial não se prolonga ao longo do tempo: “antes fazíamos amor todos os dias e o desejo era recíproco. Mas claro, tudo isso diminui quando acordamos a falar sobre o que fazer para o jantar.”

E será, de facto, necessariamente assim? A estabilidade na relação inibe o desejo?

 

Muitos terapeutas, perante este tipo de queixas, incita os casais a passarem mais tempo juntos, a ter tempo de qualidade só do casal. Se é verdade que a vida quotidiana retira, muitas vezes, disponibilidade para passar tempo a sós com o outro, também é verdade que essa dificuldade também existia, na maior parte das vezes, no início do relacionamento. Então o que mudou? Será esta estratégia terapêutica realmente adequada?

 

A especialista Esther Perel fala-nos de duas necessidades básicas no ser humano, e do aparente confronto entre elas: a necessidade de segurança, estabilidade, confiança no outro e a necessidade de novidade, mudança, mistério.

 

 A estabilidade decorre do facto de eu conhecer o outro: como reage perante as situações, quais os seus valores fundamentais, do que gosta, quais os seus limites, que projectos tem. Isto permite-me inferir sobre a forma como vai reagir no futuro, e permite-me confiar e sentir-me seguro. O desejo de novidade tem que ver com uma necessidade intrínseca (e não apenas humana) de exploração, de curiosidade perante o mundo. No entanto, este desejo do desconhecido causa-nos ansiedade. Quem já observou um gato a explorar um objecto novo pode notar como os seus olhos brilham e como simultaneamente os seus movimentos denunciam o seu medo. Nas relações humanas, esta necessidade de exploração estará também relacionada com o desejo: apaixono-me pelo mistério que é o outro. Em resumo: precisamos de ter confiança e de diminuir a nossa ansiedade, mas também de mistério, que nos dá vida mas que aumenta a nossa ansiedade.

 

Nos tempos actuais, este confronto parece estar mais presente. Vivemos um clima de ansiedade geral: não sabemos se temos trabalho, se este se manterá, até quando nos manteremos no mesmo lugar, se temos de emigrar, se teremos dinheiro suficiente para pagar as contas. O mundo muda a mil à hora e perguntamo-nos se o conseguiremos acompanhar. E quem melhor do que o nosso companheiro para exercermos a nossa necessidade de controlo sobre o mundo? Esse que nós conhecemos tão bem, a quem reconhecemos o que quer só pelo olhar, que reage de forma tão previsível?

 

Existirá solução? Como manter o desejo numa relação segura?

Talvez a(s) solução(ões) passe por entendermos, em primeiro lugar, que as duas necessidades não são opostas, se expressas de uma forma flexível e essencialmente realista. É verdade que a confiança no outro é imprescindível para estabelecermos vínculos seguros e saudáveis, inclusivamente para podermos explorar a nossa sexualidade com confiança. Mas será realista assumir que conhecemos, de facto, o outro? Que sabemos o que pensa, o que sente, como sente, como irá reagir, anulando-lhe dessa forma a sua complexidade que tanto nos apaixona? Será realista assumirmos que já não há nada a descobrir, e por isso nada a conquistar? Desejar é querer para nós, ainda que saibamos que isso nunca irá acontecer na totalidade. Porque no fundo, bem lá no fundo, existe a certeza de que o outro nos escapa na sua liberdade, na sua individualidade. A certeza pela segurança não só é ilusória como pode matar a admiração, uma das grandes componentes da paixão e do desejo.

Não existirá uma solução, mas várias soluções diferentes para cada casal. Como terapeuta, tento fazer o contrário do que acontece com a maioria destes casais: mantenho-me curiosa e atenta a quem está à minha frente, tentando nunca perder a capacidade de me surpreender com as pessoas. Emociono-me (de verdade!) com cada nova descoberta, com cada mudança adquirida. E isso não me impede (antes pelo contrário) de estabelecer uma relação de grande confiança com quem comigo se cruza no consultório. Isso fá-los acreditar na verdade: que vale a pena descobri-los.

 

E como terapeuta, desafio cada elemento dos casais a quem a rotina parece ter feito perder o desejo: a flexibilizar um pouco os seus limites de segurança e a arriscar-se a olhar para o outro como único e fascinante.

publicado às 09:25

A Depressão no casal

por oficinadepsicologia, em 02.02.10

Autora: Inês Alexandre

Psicóloga Clínica

 

A depressão de um dos elementos de um casal pode ser avassaladora para uma relação. Os testemunhos são muitos, e, infelizmente, algumas vezes o final não é feliz. Mas existem formas de mudar este final, como o demonstram alguns casais sabedores, muitas vezes sem o saber…

 

Dados recentes indicam que, em Portugal, um quarto da população sofre de depressão, cerca de 2,5 milhões de pessoas. A depressão é definida como um conjunto de sintomas, que vão desde sintomas físicos como a perda ou aumento do apetite e do peso, insónia ou hipersónia, fadiga, etc, a sintomas mais subjectivos como a perda de interesse pelas actividades que antes davam prazer, sentimento de inutilidade ou culpa, sensação de tristeza profunda. Nenhuma depressão é igual de pessoa para pessoa. De um modo geral, a depressão é uma forma de olhar o mundo e a vida: o futuro deixa de existir, tudo é visto de uma forma desesperantemente negra. Quem por lá passa diz que ninguém que nunca tenha passado por isso compreenderá o desespero. No entanto, a informação, o amor e a capacidade de empatia permitem uma ajuda eficaz por parte dos outros.

 

 

publicado às 09:47

Desaprender

por oficinadepsicologia, em 15.01.10

Autora: Inês Alexandre

Psicóloga Clínica

 

 

Então minha menina, como anda? Conte-me. Lembro-me que andava agitada.

Sim. Pega no carro, percorre a cidade, estaciona, concentra-te, pega no carro, percorre a cidade. Ouve, decide, age, a cabeça às voltas, às voltas. Aprendemos assim Dra., desde que nascemos.

Como assim desde que nascemos?

Acorda. Come. Sorri. Responde aos estímulos, senão que infelicidade. Anda, não te esqueças da mala, não te esqueças do passe, não te esqueças de prestar atenção. Concentra-te. Vê bem todas as perguntas. Um mundo justo em que estamos, se responderes sempre a todas as perguntas. Vais conseguir. Não sei bem o quê mas consegues. Anda, não pares. Acho que desaprendemos, Dra.

Desaprendemos o quê?

 

 

publicado às 10:00

Acrescentos

por oficinadepsicologia, em 15.01.10

Autora: Inês Alexandre

Psicóloga Clínica

 

 

Bom dia Dra!

Bom dia! Mas que boa disposição…

Hum, não sei se lhe diga a verdade ou não.

Então? Sobre o quê?

Sobre a minha disposição.

Mas não é para isso que aqui está?

Sinceramente, já não sei bem…porque ando por aqui. E na verdade ando a sentir-me bastante irritada. Por estas conversas nossas andarem a revelar-se tão importantes para mim. Esta minha dificuldade no corte deixa-me apreensiva.

É natural, sobretudo com a sua história.

Ah, quer dizer que não acontece sempre assim.

Não.

 

publicado às 08:43


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